domingo, 16 de janeiro de 2011

As enchentes e a especulação imobiliária

Reproduzo artigo de Luiz Carlos Azenha, publicado no blog Viomundo:

Num evento recente do qual participei estava lá a arquiteta Ermínia Maricato. Ela pediu a palavra para dizer que, infelizmente, os movimentos sociais haviam se desarticulado na luta pela “reforma urbana”. Disse que o programa Minha Casa, Minha Vida, do governo federal, tratava do subsidiário sem atacar o principal. Que, na verdade, o programa tinha sido responsável por inflacionar o estoque de terras, beneficiando a especulação imobiliária.

As tragédias do Rio de Janeiro e de São Paulo, além da inépcia generalizada — bombeiros sem equipamento para iluminação noturna, Defesa Civil dependente de aparelhos celulares, prefeituras que só agem (quando agem) para remediar as tragédias — demonstram o quanto somos reféns dos interesses imobiliários, que ao mesmo tempo determinam as leis de ocupação locais E financiam a mídia e as campanhas eleitorais.

Na entrevista abaixo, concedida antes das tragédias do Rio e de São Paulo à Caros Amigos, Ermínia faz previsões sombrias sobre o futuro das cidades se nada for feito. Meu pessimismo neste tema tem relação com o fato de que tanto o PT quanto o PSDB são almas gêmeas quando se trata da reforma urbana: ninguém fala do assunto para ver se o problema some.

Especulação da terra inviabiliza moradia popular

Participaram: Bárbara Mengardo, Gabriela Moncau, Hamilton Octavio de Souza, Júio Delmanto, Lúia Rodrigues, Otávio Nagoya, Tatiana Merlino.

A arquiteta Ermínia Maricato tem uma longa trajetória de reflexão teórica e enfrentamento dos problemas urbanos, como profissional e como militante do PT. Professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, coordenadora do programa de pós-graduação (1998-2002), foi também secretária de Habitação de São Paulo (1989-1992) e secretária-executiva do Ministério das Cidades (2003-2005). Na entrevista a seguir ela faz uma análise profunda e reveladora da situação caótica das cidades brasileiras. Vale a pena ler.

Hamilton Octávio de Souza: Onde você nasceu? O que estudou? Fale sobre a sua trajetória.

Eu nasci no interior do Estado de São Paulo, em uma cidade chamada Santa Ernestina, mas vim muito cedo para São Paulo. Meu pai foi camponês, mas se tornou um pequeno empresário, tinha uma granja de aves. A família é três quartos italiana e um quarto portuguesa. Nós tivemos que vir para São Paulo porque a minha mãe tinha uma doença, hoje eu sei que é psíquica, mas no interior nós não sabíamos bem o que era. Com 5 anos eu vim para São Paulo, estudei em escola pública, que era maravilhosa, morei no Brás e, enfim, sempre gostei muito de estudar, minha mãe não queria que eu estudasse, o meu pai me deu toda a força, acho que não tem tanta novidade aí. Foi um período em que era possível um filho de europeu, mesmo que viesse do campo, era fácil ter ascensão social em São Paulo. Foi o que aconteceu com o meu pai, ele amealhou um certo patrimoniozinho, então não é a mesma condição que o filho de camponês brasileiro, que tem origem muitas vezes na herança escrava, uma condição diferente. Bem, eu fiz química industrial no nível médio, comecei a faculdade de física na USP, depois é que eu passei para arquitetura; mas hoje eu acho que errei, estou muito apaixonada pela terra, por agricultura, por agricultura orgânica. Atualmente pertenço a uma associação que tem uma gleba de Mata Atlântica e nós estamos fazendo um pomar de frutas em extinção da Mata Atlântica, esse é o meu hobby atual. Então eu estou tão encantada, tão impressionada com a força e a exuberância da Mata Atlântica que fico pensando como nós conseguimos destruir essa riqueza.

Lúcia Rodrigues: Como surgiu essa ideia?

A associação já existia. Eu cheguei em um amigo e falei: acho que a gente devia comprar um pedaço de mata para deixar lá. E aí ele falou: mas eu já estou em um lugar que tem isso e tal. Aí eu fui, me encantei, entrei na diretoria. Temos uma médica homeopata como presidente, temos várias tribos ali, temos sete nascentes de água, então nós estamos trabalhando no tratamento e distribuição dessa água e agora nós passaremos a discutir o lixo, o esgoto.

Tatiana Merlino: Onde é?

Fica a uma hora de São Paulo, em São Lourenço da Serra. Então é a minha paixão atual e eu fiquei muito impressionada de como é que eu não fui para a agricultura, pois tem muito a ver com a questão ambiental. Eu comi uma fruta quando era criança e morava no interior que chamava pindaíva, é uma fruta lindíssima, vermelha, parece uma fruta do conde, ela é de uma árvore muito alta e aí eu falei: Mas cadê a fruta? Não existe mais. Então eu fui pesquisar e consegui, depois de muito procurar, achar uma muda da pindaíva, hoje nós plantamos quatro mudas lá no vale e aí tem outras frutas que eu nem sei o que são, comprei outras mudas, fui atrás, agora eu estou pesquisando isso. Lá tem uns malucos que entram na mata, pegam semente, estão plantando, tem um pessoal interessante. Eu gosto mais de falar disso do que falar de cidade, meu Deus do céu. O que eu quero deixar de fundamental em relação a questão urbana é que as cidades vão piorar.

Lúcia Rodrigues: Mais ainda?

Muito, muito.

Lúcia Rodrigues: Por que, professora?

Porque não tem nada sendo feito para contrariar o rumo.

Júlio Delmanto: As cidades que você diz não são só as grandes, né?

Não só as grandes, porque as cidades que mais crescem atualmente são as médias no Brasil, não são as metrópoles, as metrópoles deram uma recuada, desde a década de 80 as metrópoles estão crescendo menos e as cidades médias estão crescendo mais.

Tatiana Merlino: Nada está sendo feito nos âmbitos federal, estadual e municipal?

Não é só uma questão de governo. Primeiro não é uma questão restrita a governo, é uma questão do capitalismo periférico, eu quero fazer questão de falar isso porque muita gente fala: ah! falta vontade política! Eu vou dizer que tem problemas que são estruturais. Um deles: o mercado residencial, no capitalismo periférico, atinge uma pequena parte da população. Até 2004, quando começa uma mudança na política habitacional, da qual eu fiz parte, o mercado brasileiro produzia para 20% da população. Em São Luís (MA) é para 10% da população. Eu fico pensando, pela minha experiência, que São Paulo, por exemplo, chega a 40% da população, mas quando você vai para São Luís ou Belém (PA), o mercado não chega a 10% da população. O mercado, esse sim, segue a lei, que tem um investimento, às vezes tem um financiamento, ou às vezes até mesmo a empresa incorpora o teu financiamento, você faz um projeto que é aprovado na prefeitura de acordo com a legislação de código de obras, legislação de parcelamento do solo, legislação de zoneamento, aí isso é lançado, tem compradores que também podem ter um financiamento. Isso é o que? No Canadá, na Europa, nos EUA isso atinge de 70 a 80% da população. No Canadá isso é muito claro: 30% da população precisa de subsídio para comprar moradia. Aqui no Brasil é o oposto: tem 70% da população. Varia de cidade, de região, se tem uma classe média maior, esse número é maior, se você tem uma classe média menor, como as cidades do Norte e Nordeste, esse número é menor. Então, vivemos em uma sociedade em que uma parte da população se vira, ela não se integra ao mercado e não tem política pública para chegar nela. O financiamento, o investimento público habitacional ampliou muito a partir de 2004, é impressionante o aumento nos últimos anos. Mas na sociedade brasileira a classe média não entra no mercado. O que quer dizer que a classe média não entra no mercado? O policial, o funcionário da USP, o professor secundário mora em favela, isso é uma coisa comum. Então, o Brasil é um país típico de capitalismo periférico, onde um trabalhador regularmente empregado, com estabilidade no emprego, que é o caso de um funcionário público, não tem acesso à moradia no mercado.

Tatiana Merlino: Esse “se vira” a que você se referiu é equivalente ao déficit habitacional que há no Brasil?

É mais do que o déficit.

Tatiana Merlino: Qual é o déficit habitacional hoje do Brasil?

Olha, o déficit deve estar entre os 7 e 8 milhões, o déficit é sempre uma coisa que deve ser discutida, né? O que você considera déficit? Uma das questões que discutimos no ministério, por exemplo, é que o IBGE considera déficit a convivência de famílias e às vezes é uma decisão sua conviver com mais de uma família. Então, devo ou não considerar isso déficit? O que eu quero dizer é o seguinte: “parte da população brasileira se vira” significa que ela arruma terra, eu tenho muita restrição para usar a palavra invadindo, porque os movimentos sociais não gostam, digamos que ocupando ilegalmente, mas esse ocupando ilegalmente é uma coisa muito vasta. E construindo as próprias casas, como o Chico de Oliveira mostrou em um artigo que ficou clássico, em 1972, que essa autoconstrução, essas ocupações ilegais não eram uma coisa espontânea ou decisão deles, aquilo era o resultado do rebaixamento da força de trabalho, quer dizer uma força de trabalho que não ganha para comprar uma casa, para pagar para alguém construir, mas não dentro da lei, não é dentro do mercado, não consegue comprar a terra. E a terra é um capítulo a parte. Então essa condição de ilegalidade é geral no Brasil. Tem um município perto de Belém, Ananindeua, ou outros municípios na periferia de Recife, Salvador, Fortaleza, onde 90% dos domicílios são ilegais. Quando você chega à região metropolitana de Fortaleza o próprio IBGE dá 33% da chamada sub-habitação. Nós temos alguns estudos, não temos dados fidedignos, mas isso já mostra um pouco o que é a realidade brasileira. Quanto por cento da população brasileira mora em favela? Tem alguns trabalhos que mostram que há uma grande diferença de uma cidade para outra no Brasil, mas que a exceção que seria uma casa ilegal, construída completamente fora da lei em uma terra ocupada de forma completamente irregular, construída aos poucos, sem qualquer conhecimento de engenheiro ou arquiteto etc., é regra, não é mais exceção. Veja bem, o que era para ser exceção virou regra e o que era para ser regra virou exceção.

Tatiana Merlino: Essa é uma característica do capitalismo periférico?

É. Você vê isso no mundo inteirinho e varia um pouco em cada país. A Argentina, que já teve uma condição muito melhor socialmente na América Latina, agora está em uma situação dramática. Na Argentina você tinha menos disso, algo em torno de 20 ou 30 anos atrás, ela era mais formal, a cidade na Argentina. Fui convidada para ir a um encontro sobre moradores de rua na Argentina, eles ficaram encantados com a nossa política de morador de rua e aí eu falei: Bom, mas vocês não tinham porque vocês não tinham morador de rua e no Brasil tem há muito tempo. Se você vai para o Chile você tem uma formalidade maior na cidade, tem uma classe média mais forte. Agora o resto, Bolívia, Venezuela, que eu andei pelos morros em volta de Caracas, o próprio México, você tem uma situação que é pior do que algumas metrópoles brasileiras, porque o Brasil tem algumas coisas que são mais ricas e algumas coisas que são mais pobres.

Hamilton Octávio de Souza: Mas esse processo não está sendo revertido?

Ao contrário, as cidades do mundo estão se empobrecendo. Se você pegar a África é impressionante o que está acontecendo.

Hamilton Octávio de Souza: E São Paulo? O que acontece em São Paulo?

São Paulo está assim: o município concentra, se não me engano, 22% da população que ganha acima de 20 salários mínimos do Brasil. Então você tem uma grande concentração de renda em São Paulo, Ribeirão Preto, Santos, e Brasília – no plano piloto. Então você tem uma condição de expulsão da população desses municípios mais ricos.

Hamilton Octávio de Souza: A favelização aqui tem sido crescente, não tem? Desde a década de 50?

Mas muito mais nas periferias. Se eu pegar Cajamar, Franco da Rocha, Itapecerica da Serra, Embu, Embu-Guaçu, você tem uma periferização com o aumento da violência, com uma queda geral de índices e a gente trabalha com média, o que é complicado.

Lúcia Rodrigues: A concentração do capital é o que está levando ao empobrecimento das cidades, é isso?

Não é só. Você tem assim uma tradição de desigualdade histórica, você tem nesses países essa questão estrutural da informalidade tanto no trabalho quanto na ocupação do solo, então nós temos ilhas que são cidades do primeiro mundo, isso é tudo inadequado. Por isso que eu acho engraçado dizer que a questão é técnica. Na verdade nós copiamos a lei de zoneamento, toda a legislação do primeiro mundo e aí a gente garante uma ilha onde o resto não cabe. Para inserir a população pobre nessa cidade eu preciso transformar o conjunto, isso foi o que discutimos no Fórum Urbano Mundial e no Fórum Social Urbano.

Júlio Delmanto: Existe alguma diferença entre esses países que são chamados em desenvolvimento em relação ao resto da periferia?

Sim. O Brasil é diferente. É uma economia forte. É um player internacional. Ele passou de “nada dava certo” para “país do futuro” ou “do presente”. Mas a desigualdade é uma coisa escandalosa no Brasil. A África do Sul me impactou porque ela saiu do apartheid, em que a segregação, diferentemente da nossa, era jurídica. Então você não podia ir para a cidade se você fosse negro, a menos que você tivesse um passe. Vencer essa segregação quando o Mandela ganhou parecia fácil. Mas existe um problema que está atingindo todo o terceiro mundo que é a questão da terra. A questão da terra não foi superada com a luta contra o apartheid. Aliás, foi uma coisa que me impressionou muito, que eu ouvi de vários líderes: se a terra tivesse entrado em negociação, a paz não acontecia.

Hamilton Octavio de Souza: O que é a questão da terra? É a terra urbana?

É a terra urbana e rural. A terra está na essência da alma brasileira. A desigualdade no Brasil passa essencialmente pela questão fundiária. Campo e cidade. Só terminando a história dessa segregação, não tem nenhum mistério. Uma parte da população constrói as casas, constrói fora da lei e não tem lugar nas cidades. Às vezes os planos diretores não disseram onde os jovens iam morar, porque todo plano diretor é seguido de uma lei de zoneamento e a lei de zoneamento é lei para o mercado, e a nossa população tá fora do mercado. Então os urbanistas estão trabalhan do em um espaço de ficção, com realidade de ficção. Aliás, essa ausência dos engenheiros nem se fala. Eu quero falar depois do estrago que a engenharia fez em São Paulo.

Lúcia Rodrigues: Essas leis que você citou funcionam?

Nada. O estatuto da cidade é um sucesso no mundo. Do Brasil para o mundo. Eu sou convidada a consultoria internacional o tempo todo por conta do estatuto da cidade. Eu fui a poucos lugares, mas para onde eu fui eu falei que não está sendo aplicado no Brasil. Não está sendo aplicado.

Tatiana Merlino: Existe uma política habitacional para resolver essa questão do controle do solo?

Lei nós temos. O estatuto da cidade é ótimo. Constituição Federal nós temos. Só que nós não aplicamos a função social da propriedade. Só terminando aquilo. A nossa lógica é que a mão de obra barata de que o Celso Furtado falava muito, que garante a exportação de riqueza, que garante uma elite conspícua, que é patrimonialista, que se agarrou a este Estado e fez dele o que fez, tem a lógica de que nós temos que ter uma mão de obra absolutamente rebaixada no seu preço para poder segurar essa relação.

Lúcia Rodrigues: Mas isso não é anticapitalista? Por que se você tem gente ganhando mais, injeta força e fluxo no mercado.

É engraçado isso. Porque o Ford descobriu que os operários precisavam ganhar melhor para que o capitalismo fosse melhor em 1905, início do século 20. Não é essa a lógica no Brasil. Inclusive uma das coisas que nós nos perguntamos é se o capitalismo brasileiro, principalmente a burguesia nacional, porque as transnacionais não estão nem aí se vão esgotar as reservas, se as cidades vão virar um negócio inviável, pretende se tornar viável. O capitalismo no Brasil não está preocupado em viabilizar. As nossas cidades estão ficando inviáveis. O automóvel está inviabilizando não só São Paulo, mas todas as cidades brasileiras. Brasília está também com um problema seríssimo de trânsito. Então você tem um problema que também é estrutural. A indústria automobilística é responsável por 20% do PIB do mundo, se eu colocar a exploração de petróleo, a distribuição de petróleo, toda a indústria da borracha, das autopeças. E todas as obras nas cidades são uma questão de infraestrutura para o automóvel andar. Quebrar esse modelo é o que seria necessário para incorporar os pobres.

Lúcia Rodrigues: E como se quebra esse modelo?


Vamos primeiro falar da terra. Porque esse “como se quebra esse modelo” é uma reflexão muito difícil para eu fazer depois que eu saí do governo federal. A terra no Brasil durante vários séculos, a propriedade da terra, esteve ligada à detenção de poder social, político e econômico. É interessante perceber em uma cidade como São Paulo como é que a área de proteção dos mananciais, que é uma área protegida por lei federal, estadual e municipal e planos de tudo quanto é tipo, está sendo ocupada. O poder de polícia sobre o uso do solo tem cinco organismos: a Sabesp, a Cetesb, Eletropaulo, o poder municipal sobre o parcelamento do solo, e a Polícia Florestal. Todo mundo é responsável pela fiscalização. Então não falta lei, não falta plano. É bem importante deixar isso claro. Estou cansada de ouvir gente dizendo que falta planejamento, falta plano diretor. Não falta nada. E não falta lei no papel. O que falta é que essa população tem que morar em algum lugar. E ela vai morar onde? Então pensa na população que chega na cidade de São Paulo. O centro está se esvaziando. Isso parece incrível, aliás, em todas as cidades brasileiras grandes. Então nós temos em área de proteção dos mananciais, já vi secretário de meio ambiente falar em um milhão e quinhentas mil pessoas. E já ouvi gente da Empresa Metropolitana de Planejamento falar em dois milhões de pessoas. É uma ligeira margem de dúvida. Isso mostra que nós não sabemos quantas pessoas moram na área de proteção dos mananciais.

Hamilton Octavio de Souza: Qual a consequência disso para o abastecimento de São Paulo?

Nós estamos buscando água na bacia do rio Piracicaba. Falam em buscar água serra abaixo. Estão falando em buscar água não sei mais onde no vale do Paraíba, e nós temos duas represas em que a água vem por gravidade, mas a água está crescentemente contaminada, e eu estou me referindo à contaminação recém-descoberta de que mesmo depois do tratamento existem hormônios e antidepressivos na água. Mas isso é outra coisa, são pesquisas mais recentes. Eu tenho então uma metrópole na área de proteção dos mananciais. E se os governos decidissem cumprir a lei? Não entra mais ninguém ou tem que sair? O que aconteceria? Os conflitos do MST iam ser refresco. Eu já tive aluno que afirmou que haverá guerra civil. Eu concordo. Se voce de repente pega todo mundo que ocupou os morros do Rio de Janeiro, que estão desmoronando, ou dos morros de São Paulo, que desmoronaram meses atrás, e proíbe de ocupar, é guerra. Mas aí alguém fala: tem que ter uma política habitacional. Tem. Metade da população do Rio de Janeiro mora em domicílios ilegais. Como é que você faz uma política habitacional para incorporar metade da população sem uma completa revolução com a terra? Sem uma completa mudança na característica do mercado imobiliário? Sem uma completa mudança no direito de propriedade? Sem uma completa mudança da forma de ação do Estado? De que jeito?

Tatiana Merlino: Mas como é muito pouco provável que aconteça, para onde a gente vai caminhar?

Nós estamos caminhando para o caos.

Tatiana Merlino: O que aconteceu no Rio de Janeiro é a prova disso?

É. O que aconteceu em São Paulo, em todas as cidades, é a maior prova disso. Se você somar a falta de controle de uso e ocupação do solo, que não existe a consciência de que é necessário controlar, mais a falta de planejamento com a questão da macrodrenagem… E ainda com mais incentivo para a matriz automobilística, nós vamos piorar.

Lúcia Rodrigues: Mas como romper com esse modelo?

Eu acho sinceramente que não vai ser simples. A questão da terra sempre foi muito clara no campo, mas ela não foi muito clara na cidade. Por quê? Porque ninguém se dava conta de que a regra era exceção e a exceção era regra.

Lúcia Rodrigues: Mas qual é o problema da terra?

Um aluno meu me mostrou a funcionalidade da confusão registrária no Brasil. Ele mostrou que nos parques estaduais paulistas existiam sete andares de registro de propriedade no mesmo pedaço de terra. Por quê? Porque a história do registro de propriedades no Brasil é uma história de fraudes. Eu desagradei muita gente, mas falo isso o tempo todo. A história da propriedade privada no Brasil é uma história de fraudes sistemáticas. Não é que você tenha uma fraude ou outra. É regra de novo. O Ariovaldo Umbelino mostrou em uma de suas palestras (ele é um geógrafo competente, se aposentou da USP) um anúncio de venda de uma propriedade de 40 mil hectares, no qual a grande vantagem que oferecia era uma escritura de 4 mil hectares. Porque a cerca anda. Então ter uma escritura já é uma maravilha. E a cerca anda no Brasil. Então o que me impressionou na tese do Joaquim de Brito, esse meu aluno, é que o governo não tem nenhum interesse em cancelar registros que se revelam falsos.

Tatiana Merlino: E no caso da Cutrale?

Esse é outro exemplo que eu adoro dar. Quer dizer, para a mídia brasileira foi muito mais importante a derrubada de meia dúzia de pés de laranja do que o patrimônio público ser apropriado privadamente. Ora, é regra. O Pontal todo. E a polícia e o Judiciário têm a coragem de atacar o MST, que é meia dúzia de gente pobre que quer o mínimo, que é o acesso à terra. Vai fazer a discriminatória das terras públicas que você vai ver quanto esse país vai ganhar de terra!

Bárbara Mengardo: Existe uma estimativa de quantos hectares de terras griladas são ocupadas por grandes empresas?

Na verdade os documentos são produzidos. Foi isso que eu verifiquei com a tese do Joaquim de Brito, que, aliás, eu pedi que ele produzisse um texto que fosse mais palatável para a linguagem de um livro e ele morreu na madrugada que ele escreveu o texto. Aprendi muito com ele porque ele tinha documentos de todas as terras e dizia: “Olha, ainda tem registros novos aparecendo”. Ele mostrou que tinha propriedade no litoral que subia a serra. E aí quando eu vejo a mídia atacar o MST eu fico absolutamente impressionada. Em um país onde a história da propriedade é de fraude. Eu resolvi juntar livro sobre isso. Aí eu comecei a ver que nós temos uma produção gigantesca sobre a fraude na propriedade da terra, sobre as disputas de terra, sobre morte.

Lúcia Rodrigues: Quem está por trás disso? São os cartórios? É o governo?

Tudo. É a sociedade brasileira. É poder vinculado à propriedade.

As enchentes tratadas como espetáculo

Reproduzo artigo de Laurindo Lalo Leal Filho, publicado no sítio Carta Maior:

Todas as redes comerciais de televisão no Brasil têm as suas moças do tempo. São herdeiras, em São Paulo, do Narciso Vernizzi, o primeiro “homem do tempo” da rádio Jovem Pan.

Elas surgem do nada, entre uma notícia e outra, aparecem no canto da tela e caminham para o centro, mostrando mais que o tempo as suas belas curvas.

Em casa, o telespectador vê atrás das moças as indicações do clima e da temperatura em todo o Brasil. Com algumas variações, esse tipo de informação é universal. O canal mundial da BBC mostra o tempo em várias partes do mundo, sem as moças.

São informações úteis, mas limitadas. Ajudam a sair de guarda-chuva no dia seguinte ou, aos viajantes, a escolha do que colocar na mala. Não sei se informações tão superficiais e genéricas contribuem para decisões mais importantes, como dos agricultores, por exemplo.

Apesar do avanço da internet, o rádio e a televisão ainda são os mais eficientes e abrangentes serviços públicos de informação. Não há outro meio que consiga falar de forma tão rápida para milhões de pessoas ao mesmo tempo.

Em momentos críticos tornam-se imprescindíveis. Pena que, por aqui, são pouco usados nesse tipo de prestação de serviços.

No caso de tragédias, como as deste início de ano, ao invés de moças desfilando à frente de ilustrações artísticas, deveríamos ter as programações interrompidas.

Em seu lugar seriam formadas cadeias nacionais ou locais de rádio e TV, antes das catástrofes, dando orientações seguras para a população. Sem pânico, mas com precisão e firmeza. E não generalizando com frases do tipo “chove no litoral do nordeste”.

Trata-se de um de trabalho que deve ser o mais localizado possível, com o envolvimento articulado dos serviços de meteorologia, da defesa civil e do jornalismo, na produção das informações.

Quantas vidas não poderiam ter sido salvas se, em vez colocar no ar o Ratinho ou o Big Brother, as emissoras tivessem avisado à população de que fortes chuvas estavam previstas para a serra fluminense na noite anterior à tragédia, com instruções dos poderes públicos sobre como agir.

Ou, no caso, de São Paulo que vias deveriam ser evitadas na iminência dos temporais, já que não há segredo nessa cidade sobre onde se localizam os eternos pontos de alagamento.

Para obter mais eficiência, esse serviço deveria ter seu foco nas informações locais. Dai a importância da regionalização das programações de rádio e TV, tão combatida pelos concessionários do setor.

No entanto são elas que darão às emissoras regionais e locais experiência, tanto na produção como na técnica, para enfrentar com competência situações extraordinárias.

Nem todos se salvariam, é verdade. Mas, com certeza, os danos seriam menores.

Furacões violentos que varrem o Caribe todos os anos causam grandes estragos materiais em Cuba, mas pouquíssimas vítimas.

Simplesmente porque as autoridades estabelecem planos precisos para a retirada da população das áreas criticas e a orientam através do rádio e da TV, com razoável antecedência, sobre as medidas que devem ser tomadas.

Muitos navios não foram à pique na costa brasileira graças ao programa radiofônico “A Voz do Brasil”. A seção “Aviso aos navegantes” informava todos os dias, minuciosamente, as condições das bóias de luz, sinalizadoras dos perigos naturais existentes no mar.

Era o rádio atuando como serviço público numa época de recursos eletrônicos muito limitados, se comparada aos hoje existentes.

Satélites transmitem informações meteorológicas com alto grau de precisão e as redes de rádio e TV cobrem todo o território nacional.

Falta apenas articular esses dois serviços com planos nacionais e locais de prevenção à catástrofes naturais.

No caso das enchentes no sudeste e centro-oeste, trata-se de problema datado, de dezembro a março. Há todo o resto do ano para o trabalho de planejamento e articulação.

Quem toma a iniciativa?

Um pouco do mesmo: a mídia em 2011

Reproduzo artigo de Izaías Almada, publicado no blog Escrevinhador:

Tudo indica que a temporada de caça ao governo Lula e agora ao governo Dilma vai continuar por parte da velha mídia. Natural pelo lado de quem faz oposição, mas irresponsável e antibrasileiro por outro, pela maneira e desfaçatez com que é feita. Evidencia-se quase que uma obsessão, onde a frustração, a inveja e o preconceito são bem maiores do que aquilo que se poderia imaginar. E a má fé também, não sendo apenas retórica eleitoral. Motivos para isso – é claro – nunca irão faltar. E se por acaso faltarem, não há problema: inventam-se novos. Não tem sido assim nos últimos oito anos?

Embora se possa argumentar que boa parte do povo brasileiro já não dá ouvidos a uma imprensa venal, manipuladora e que se considera acima do bem e do mal, ainda assim ela continua a causar estragos e – o que é mais grave, até por ser uma vitória parcial desse nocivo conglomerado midiático – consegue propositadamente misturar alhos com bugalhos e lançar a dúvida, a descrença e a desesperança em muitos corações e mentes. Um povo ignorante de seus direitos ou sem discernimento sobre muitas das questões que lhe afetam no dia a dia é sempre mais fácil de manipular. A democracia que se vende não é exatamente aquela que se pratica.

Se, por exemplo, o uso indevido e indiscriminado de passaportes diplomáticos tem sido usado há muitos anos por autoridades (sic) brasileiras, por qual motivo só agora, quando beneficiariam os filhos do presidente Lula, foram denunciados como graves crimes de favorecimento? Que se devolvam, então, todos os passaportes ilegalmente distribuídos, se a lei assim o determina, para todos aqueles que se julgam acima dela, provavelmente incluindo-se aí nesta lista alguns figurões dos nossos meios de comunicação, empresários e políticos de todos os partidos.

E a tentativa capciosa de desviar a atenção dos leitores, ouvintes e telespectadores com questões mundanas sobre a nova presidenta Dilma Roussef? Bobagens e idiotices como saber se estava bem vestida no dia da posse, especular sobre o seu apoio ou não aos estilistas de moda brasileiros, sobre o seu novo cabeleireiro, suas eventuais ligações à Tradicional Família Mineira e os bailes da sociedade belorizontina quando adolescente. Assuntos sérios e relevantes, como se pode notar.

E agora, com a temporada de chuvas, deslizamentos e alagamento, a hipocrisia e o cinismo chegam quase à perfeição. No Rio de Janeiro, o culpado pela tragédia é o governo federal. Em São Paulo, estado e capital, exemplos de grandes administrações públicas, a responsabilidade é da natureza, para não dizer de Deus, pois a mídia, mesmo livrando a cara do governo demo tucano, ficaria mal com a Opus Dei. Pior ainda: seria temerário equiparar Deus e Lula, jogá-los no mesmo samburá… Não por temerem a Deus, é claro, mas por temerem aumentar a popularidade do ex-presidente, colocado em tão honrosa companhia.

E assim começa o novo ano, o novo governo. Renovam-se expectativas, esperanças e temores. A sociedade contemporânea com suas invenções e tecnologias, seu consumismo desenfreado, define o que devemos comprar, o que devemos vestir, o que devemos pensar, a quem devemos amar ou odiar, nesse vale-tudo ideológico e cultural, onde uma sinfonia de Beethoven ou um chorinho de Pixinguinha têm menos valor que uma cena degradante de um BBB; onde a televisão e a internet ensinam como o cidadão deve odiar e atirar numa deputada em Tucson, ou ainda como leiloar um jogador de futebol, atualmente mais famoso pelas suas noitadas do que pelos gols que marca.

Berlusconi é um exemplo de ética e moralidade pública. Obama, o prêmio Nobel da Paz aprova o maior orçamento militar da história dos EUA, os vazamentos wikis confirmam para o mundo como é que se faz política de dominação e a Cuba do ditador Fidel Castro envia 1200 médicos para ajudar a combater a cólera no Haiti.

Engraçado, acho que essa última frase ficou fora do contexto…

Leonardo Boff e a tragédia no RJ

Reproduzo artigo enviado pelo teólogo Leonardo Bofff:

Estou enviando artigo sobre a tragédia que se abateu sobre as cidades serranas do Rio. É uma reflexão que procura ir às causas mais profundas deste cataclisma.

Um abraço, Lboff

O preço de não escutar a natureza

O cataclisma ambiental, social e humano que se abateu sobre as três cidades serranas do Estado do Rio de Janeiro, Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo, na segunda semana de janeiro, com centenas de mortos, destruição de regiões inteiras e um incomensurável sofrimento dos que perderam familiares, casas e todos os haveres tem como causa mais imediata as chuvas torrenciais, próprias do verão, a configuração geofísica das montanhas, com pouca capa de solo sobre o qual cresce exuberante floresta subtropical, assentada sobre imensas rochas lisas que por causa da infiltração das águas e o peso da vegetação provocam frequentemente deslizamentos fatais.

Culpam-se pessoas que ocuparam áreas de risco, incriminam-se políticos corruptos que destribuíram terrenos perigosos a pobres, critica-se o poder público que se mostrou leniente e não fez obras de prevenção, por não serem visíveis e não angariarem votos. Nisso tudo há muita verdade. Mas nisso não reside a causa principal desta tragédia avassaladora.

A causa principal deriva do modo como costumamos tratar a natureza. Ela é generosa para conosco pois nos oferece tudo o que precisamos para viver. Mas nós, em contrapartida, a consideramos como um objeto qualquer, entregue ao nosso bel-prazer, sem nenhum sentido de responsabilidade pela sua preservação nem lhe damos alguma retribuição. Ao contrario, tratamo-la com violência, depredamo-la, arrancando tudo o que podemos dela para nosso benefício. E ainda a transformamos numa imensa lixeira de nossos dejetos.

Pior ainda: nós não conhecemos sua natureza e sua história. Somos analfabetos e ignorantes da história que se realizou nos nossos lugares no percurso de milhares e milhares de anos. Não nos preocupamos em conhecer a flora e a fauna, as montanhas, os rios, as paisagens, as pessoas significativas que ai viveram, artistas, poetas, governantes, sábios e construtores.

Somos, em grande parte, ainda devedores do espírito científico moderno que identifica a realidade com seus aspectos meramente materiais e mecanicistas sem incluir nela, a vida, a consciência e a comunhão íntima com as coisas que os poetas, músicos e artistas nos evocam em suas magníficas obras. O universo e a natureza possuem história. Ela está sendo contada pelas estrelas, pela Terra, pelo afloramento e elevação das montanhas, pelos animais, pelas florestas e pelos rios. Nossa tarefa é saber escutar e interpretar as mensagens que eles nos mandam.

Os povos originários sabiam captar cada movimento das nuvens, o sentido dos ventos e sabiam quando vinham ou não trombas d’água. Chico Mendes com quem participei de longas penetrações na floresta amazônica do Acre sabia interpretar cada ruído da selva, ler sinais da passagem de onças nas folhas do chão e, com o ouvido colado ao chão, sabia a direção em que ia a manada de perigosos porcos selvagens. Nós desaprendemos tudo isso. Com o recurso das ciências lemos a história inscrita nas camadas de cada ser. Mas esse conhecimento não entrou nos currículos escolares nem se transformou em cultura geral. Antes, virou técnica para dominar a natureza e acumular.

No caso das cidades serranas: é natural que haja chuvas torrenciais no verão. Sempre podem ocorrer desmoronamentos de encostas. Sabemos que já se instalou o aquecimento global que torna os eventos extremos mais freqüentes e mais densos. Conhecemos os vales profundos e os riachos que correm neles. Mas não escutamos a mensagem que eles nos enviam que é: não construir casas nas encostas; não morar perto do rio e preservar zelosamente a mata ciliar. O rio possui dois leitos: um normal, menor, pelo qual fluem as águas correntes e outro maior que dá vazão às grandes águas das chuvas torrenciais. Nesta parte não se pode construir e morar.

Estamos pagando alto preço pelo nosso descaso e pela dizimação da mata atlântica que equilibrava o regime das chuvas. O que se impõe agora é escutar a natureza e fazer obras preventivas que respeitem o modo de ser de cada encosta, de cada vale e de cada rio.

Só controlamos a natureza na medida em que lhe obedecemos e soubermos escutar suas mensagens e ler seus sinais. Caso contrário teremos que contar com tragédias fatais evitáveis.

Confecom corre risco de ser desconsiderada

Reproduzo matéria de Ana Rita Marini, publicada no sítio do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC):

No governo que se inicia, o Ministério das Comunicações precisa, efetivamente, se transformar em um local de políticas estratégicas de comunicação e não ser o balcão de negócios, de atendimento a demandas particulares. Dirigentes do FNDC avaliam que ao apontar para nova consulta pública sobre o marco regulatório do setor, como declarou recentemente o ministro Paulo Bernardo, o governo atual pode invalidar todo o esforço da Confecom.

A manifestação do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, acerca dos rumos que o governo federal dará ao marco regulatório do setor é preocupante, julga o coordenador geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Celso Schröder. “Ao apontar para uma nova consulta à população brasileira sobre a regulamentação da comunicação, este governo nega a Conferência Nacional de Comuicação (Confecom), que foi um espaço legítimo, constituído a partir do próprio governo, com participação da sociedade civil e dos empresários”, entende Schröder.

Ele ressalta que a Conferência apontou para decisões, para ações, e isso vinha sendo encaminhado, envolvendo muito esforço, muita gente. O governo anterior, além da Confecom, realizou, no final do ano passado, um Seminário Internacional de regulamentação da mídia, produziu um anteprojeto de lei. “Entendo que o governo atual tem a obrigação de se mover a partir desse projeto”, destaca o coordenador-geral do FNDC.

Já o secretário-geral do FNDC, José Sóter, tem uma avaliação diversa. Para ele, a estratégia de fazer audiências públicas, como o ministro sinalizou, abrir um amplo debate sobre o marco regulatório é fundamental para construir um dispositivo legal que atenda todos os segmentos da sociedade. “Vejo como positivo que se abra esta discussão, porque até hoje nenhum segmento da sociedade conhece o documento elaborado pelo ex-ministro Franklin Martins, que não foi aberto à participação dos segmentos. Como temos uma conformação diferente nesta nova legislatura, acho que não podemos perder a oportunidade de debater. Queremos saber o teor da proposta e poder discuti-la, ressalta Sóter.

Schröder, entrentanto, avalia que a sociedade já se manifestou e essa nova consulta seria para contemplar o grupo de empresários que se recusou a participar da Confecom. “O Ministério das Comunicações precisa, efetivamente, se transformar num ministério de políticas estratégicas de comunicao. Não pode ser o balcão de negócios, atendimento a demandas particulares”, afirma o coordenador-geral.

Quebra do pacto

Berenice Mendes, cineasta, membro da Coordenação Executiva do FNDC, ressalta que o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) - citado como prioridade pelo ministro Paulo Bernardo, em relação ao marco regulatório - é um sonho, uma necessidade, uma urgência, não só para o povo brasileiro, mas para a Nação. “Mas a sua execução, que é, talvez, a missão mais trabalhosa do ministro, não pode excluir que a Constituição Federal seja cumprida, destaca Berenice.

“Não é possível que 22 anos depois, continuemos descumprindo a nossa lei maior. O PNBL pode ser uma prioridade em termos de investimento, mas o cumprimento da Constituição Federal não é negociável, nem entra nesse âmbito. Ela tem que ser cumprida”, reforça a cineasta, adiantando que os movimentos sociais não vão abrir mão de exigir o cumprimento da Carta brasileira. “É o acordo social que este país tem em vigor. Ou então, quebre-se o pacto e vamos todos para uma nova Constituinte, vamos todos medir força novamente”, defende Berenice, ao destacar que a CF tem que ser protegida pelo poder Judiciário, cumprido pelo Executivo e pelo Legislativo, no que se refere à regulamentação do Capítulo V. “Tudo mais a gente senta e vê a razoabilidade, as possibilidades. Mas a regulamentação é inegociável”, afirma ela.

A psicóloga Roseli Goffman, representante do Conselho Federal de Psicologia (CFP) na Coordenação Executiva do FNDC, salienta que o voto popular já mostrou que a população está mais consciente e é o momento deste governo reconhecer os 56% da votação brasileira, “pelos avanços da participação popular na política pública – com o histórico das conferências do governo Lula”, destaca ela. “Qual consulta pública foi mais importante que a Confecom, que mobilizou o país inteiro, num grande investimento do governo?”, ressalta Roseli, afirmando que o discurso do ministro Paulo Bernardo, de não encaminhar ao Congresso o anteprojeto de lei elaborado pelo governo anterior, foi entendido como um recuo do governo Dilma.

O CFP, neste momento, enfatiza ainda a necessidade da imediata regulação da publicidade dirigida à criança. “São 200 projetos no Parlamento sobre este assunto. Até quando um contingente de 100 parlamentares vão bloquear todos os avanços sociais brasileiros?”, questiona a psicóloga.

Se não der andamento ao anteprojeto de lei elaborado pelo governo anterior, a administração de Dilma se iniciará nesta área “com a mesma contaminação de todos os governos para trás dela”, avalia Berenice. “Se ela preza tanto a liberdade de expressão, que assegure de forma eficaz tudo o que está previsto no artigo V a Constituição Federal”, ressalta a cineasta.

O FNDC solicitou audiências com o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, e da Secretaria Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, para tratar dos temas relativos ao período pós-Confecom.

O futuro da internet em debate

Reproduzo artigo de Eduardo Guimarães, publicado no Blog da Cidadania:

Apaixonei-me pelo tema liberdade versus regulação da internet. Aprendi muito desde que publiquei aqui uma série de artigos oriundos dos casos espantosos de uso criminoso da rede que vieram a público recentemente. E o melhor é que, além de aprender, também ensinei algumas coisas. E tudo isso só foi possível graças aos militantes da liberdade na rede que, ainda que com truculência, fizeram crescer um debate necessário

A mais incrível forma de comunicação já criada vem sendo usada para propagar ódio, preconceitos, violência e perversões sexuais de natureza criminosa, por um lado. Mas, por outro lado, há interesses poderosos querendo acabar com a liberdade nesse meio de comunicação.

Na última sexta-feira, reuni-me, aqui em São Paulo, com expoentes do ativismo em defesa da liberdade na rede, tais como a historiadora Conceição de Oliveira (editora do blog Maria Frô) e o sociólogo Sérgio Amadeu (editor do blog Trezentos).

A reunião ocorreu por iniciativa desses ativistas, que pretenderam me explicar o que acreditavam que eu não entendia e que estaria fazendo com que, com a projeção que acreditam que tenho, estivesse colaborando com iniciativas maliciosas como a de Azeredo, notadamente a serviço de gente como o banqueiro Daniel Dantas ou de países e corporações incomodados pela liberdade na internet.

O projeto de Azeredo foi alcunhado como AI-5 digital por seu caráter intrínseco de pretender tolher parte da liberdade de todos em prol do combate aos criminosos digitais, uma idéia análoga à obra intelectual do filósofo inglês do século XVII Tomas Hobbes. E a mera leitura da proposição do parlamentar mineiro deixa ver a intenção de estabelecer controles que visam tolher a liberdade política sob a capa do combate a pedofilia, golpes, preconceitos etc.

Há leis já existentes que poderiam ser usadas para combater e punir o uso malicioso da internet, mas que não são efetivamente usadas a contento exatamente como grande parte do arcabouço legal do país não é usado no mundo físico por deficiências estruturais, filosóficas, políticas e éticas do Poder Judiciário.

A razão da virulência que se viu por parte da militância pela liberdade na rede contra este blogueiro, condenada inclusive pelos expoentes desse ativismo com os quais me reuni, na maior parte decorre da percepção de um plano verossímil de grandes interesses transnacionais de combater, por exemplo, fenômenos como o Wikileaks, que depende do anonimato na internet para existir.

Nesse encontro com ativistas pela liberdade na internet, porém, além de aprender tudo isso, também pude ensinar – o que foi reconhecido por meus interlocutores. Disse-lhes que esse debate não pode ser soterrado e que, ao contrário do que disseram vários comentaristas neste blog, muitos dos quais autores de ataques violentos contra mim em outras redes sociais, é improcedente a afirmação de que tal debate “já ocorreu”.

O debate, como se tornou consenso naquele encontro, ainda ocorrerá, porque há uma outra militância contrária à que defende a liberdade na rede e que contempla um sentimento legítimo e crescente na sociedade, um sentimento de temor da internet e do uso que vem sendo feito dela para delinqüir, difamar, aliciar, furtar, corromper moralmente etc., processo que visa, primordialmente, os jovens.

Por ser um debate público que ainda ocorrerá – até porque, tramitam, no Poder Legislativo, projetos de lei sobre controle da internet, os quais ainda serão votados –, a militância que combate o inegável viés político oriundo do interesse das grandes corporações, sobretudo as de mídia, terá que abandonar a tentativa de criminalizar opiniões contrárias se não quiser ser desmoralizada quando esse debate chegar ao grande público.

O grupo que se reuniu comigo para me explicar as razões da tal militância e para me convocar para colaborar com ela admitiu isso, que o debate é inevitável. E admitiu, também, que o discurso contrário ao AI-5 digital – como chamam a lei de Azeredo – é muito auto centrado e não está se preparando para o debate com os que pensam diferente.

Há um sentimento de medo da internet, na sociedade. Um medo que um de meus interlocutores bem classificou como análogo ao medo que regeu o plebiscito sobre as armas, no qual a aparente maioria que apoiava o desarmamento da sociedade foi fragorosamente derrotada quando os defensores do armamentismo amedrontaram o público.

Um ponto ficou em suspenso, ao fim do encontro com ativistas. Não houve esclarecimento sobre o aparente crescimento dos crimes pela internet. Apesar de dizerem que apenas parece que crescem porque estão sendo mais combatidos, não souberam me dizer quais seriam as estatísticas que comprovariam o fato, nem se os crimes não estão crescendo mais do que a inclusão digital, o que mostraria necessidade de se fazer alguma coisa a mais para combatê-los.

Fiz, então, uma sugestão àqueles que me propuseram a reunião para me esclarecerem sobre a questão da liberdade na internet: pessoas como eu poderiam ir para o lado deles – inclusive no conjunto da sociedade, quando esse debate vier a público – se quem combate projetos maliciosos como o de Azeredo se dispuser a tomar dos ditos “vigilantes” o discurso do medo.

Meus interlocutores titubearam quando lhes disse que quando esse debate vier a público, a tática do medo reduzirá a um miado de gatinho essa grande gritaria contra quem parece dissentir da liberdade na internet, exatamente como aconteceu no plebiscito das armas, pois a sociedade está assustada e indignada com o uso abusivo da rede.

Assumi o compromisso de me engajar na luta contra projetos que podem ser usados contra ciberativistas como eu mesmo, como o do senador Eduardo Azeredo, o “mensaleiro” de estimação da mídia. Contudo, desde que esse movimento se preocupe com os crimes na internet, tomando dos “vigilantes” o discurso do medo e, ao mesmo tempo, contemplando um sentimento que ganha força na sociedade.

Voltarei ao assunto.

Kassab herdando o serrismo

Reproduzo artigo de Luis Nassif, publicado em seu blog:

É complicado o estado de espírito dos últimos soldados de Serra.

Praticamente foram expelidos do governo do Estado. É questão de tempo para ser formalizado o rompimento entre Serra e Alckmin.

Por outro lado, foram se abrigar na Prefeitura de Gilberto Kassab.

Kassab é o futuro, Serra o passado.

Até agora, revelou-se um aliado leal. Absorveu sozinho as críticas contra as enchentes dos últimos anos, manteve serristas em postos estratégicos. Teve paciência para suportar os ataques de estrelismo de Soninha, na sub-prefeitura da Lapa. Considerando-se ungida pelo governador, Soninha chegava a afrontar Kassab nas reuniões da prefeitura. Foi afastada sem alarde.

Hoje em dia, não há mais essa divisão da prefeitura entre os assessores de primeira linha, egressos do serrismo, e os de segunda, de Kassab.

Entre os serristas propriamente ditos há a sensação de que cada dia de vida com o antigo líder nunca é mais, é sempre menos. Não há espaço no governo estadual, menos ainda no plano federal. Apenas na Prefeitura. Em algum momento, de serristas se tornarão kassabistas. Principalmente porque sabem que foram jogados no limbo pelo excesso de ambição e falta de habilidade política e solidariedade com eles, da parte de Serra.

Mesmo sabendo que com Alckmin haveria um expurgo no governo do Estado, preferiu bancar o adversário para fortalecer sua aposta na presidência.

O único ponto a garantir a sobrevida de Serra é a falta de um candidato competitivo para suceder Kassab – que certamente se aventurará a vôos maiores, ao governo do Estado.

É uma espécie de dá ou desce: ou Serra se prepara para ser o candidato de Kassab a prefeito; ou começa a escrever seu livro de memórias.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Bons ventos no Ministério das Comunicações

Reproduzo artigo de Altamiro Borges, postado no Blog do Miro

Tomou posse nesta segunda-feira (3) o ministro das Comunicações do governo Dilma Rousseff, o ex-sindicalista Paulo Bernardo. Bem diferente dos seus antecessores, que nunca trataram a pasta como estratégica no processo de democratização do país, ele deu sinais positivos neste rumo. Em seu rápido pronunciamento, afirmou que a sua prioridade será o fortalecimento do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), “que garanta o acesso da grande massa da população brasileira ao serviço”. Ele ainda enfatizou o desafio da reestruturação dos Correios. "A empresa é uma das mais admiradas do país e nós queremos garantir que isso continue".

Para desespero dos barões da mídia, Paulo Bernardo também defendeu a urgência de um novo marco regulatório para o setor. “Para o fortalecimento das comunicações, não posso omitir a necessidade do marco regulatório. Não se trata da revisão de direitos arduamente conquistados de liberdade de expressão... É uma garantia da pluralidade da informação", afirmou o ministro, que assumiu a pasta das Comunicações após deixar a do Planejamento, ocupada no governo Lula. É evidente que esta meta, que esbarra na raivosa resistência da ditadura midiática, demandará forte pressão dos movimentos sociais.

Alvarez desagrada as teles

Outro sinal positivo foi dado com a composição do Ministério. Paulo Bernardo indicou como seu secretário-executivo, segundo no posto de comando da pasta, o ativo Cezar Alvarez, ex-assessor especial do presidente Lula e coordenador do programa de inclusão digital do governo passado. Esta nomeação deve ter incomodado as poderosas operadoras de telefonia, as teles – na sua maioria, multinacionais –, conforme já registrou, num texto que visa estimular a cizânia, o sítio Convergência Digital:

“A decisão deverá desagradar as empresas de telefonia, que identificaram Alvarez como o principal adversário político a ser combatido no governo Dilma Rousseff, na tentativa de esvaziar o ímpeto da implantação do Plano Nacional de Banda Larga... Alvarez colheu dentro e fora do governo Lula inimigos poderosos, que não vão se acomodar diante do novo quadro político do Ministério das Comunicações”.

O destrutivo lobby das teles

Ainda segundo revela o sítio, “as teles não perdoam Cezar Alvarez pelo fato dele ter interferido diretamente na Anatel nos últimos meses e obrigado a agência reguladora a colocar a banda larga como serviço público, sob o regime privado, na revisão dos contratos de concessão... Nas últimas semanas Alvarez foi duramente combatido dentro do Palácio do Planalto por executivos das empresas de telefonia, na tentativa de evitar a nomeação dele para a Secretaria Executiva do Ministério das Comunicações”.

Como se observa, o ministro Paulo Bernardo terá muitas dores de cabeça. Se não se atolar no pragmatismo conciliador, ele terá que enfrentar os latifundiários da radiodifusão, que não aceitam qualquer tipo de marco regulatório, e as ambiciosas teles, que não toleram entraves aos seus lucros. Caso queira, de fato, encarar a comunicação como algo estratégico para o aprofundamento da democracia, Paulo Bernardo necessitará do respaldo da presidenta Dilma, de muita convicção e habilidade política e de forte pressão dos movimentos sociais. O jogo promete ser duro, mas parece que começou bem.

Sócio inesperado

Reproduzo artigo de Mauricio Dias, postado no site Carta Capital


Lula entra no “Clube dos Eleitos” juntamente com 12 advogados, 2 militares, um médico, um economista e um sociólogo

Dentro de alguns dias, o presidente Lula será um ex-presidente. Deixa o poder, após oito anos, com o feito inédito de eleger um sucessor que ele próprio escolheu.

Despede-se com taxas elevadas de desaprovação da mídia e com históricas taxas, em torno de 80%, de aprovação da sociedade. Quem se engana?

Lula, um ex-torneiro mecânico, pernambucano de baixa escolaridade, driblou o provável destino ao escapar do Nordeste para o Sudeste como migrante pau de arara.

Em São Paulo, travou lutas históricas no sindicalismo do ABC paulista, no fim dos anos 1970, e terminou encarcerado, suspeito de ser um perigoso subversivo. Havia uma evidência sólida, uma barba espessa, naquele líder operário que os militares trancafiaram por uns tempos sob aplauso de muitos patrões.

Fundou o Partido dos Trabalhadores. Nome que, supostamente, expressava uma representação de classe. Teve apoio fundamental da Igreja Católica, de movimentos sociais, de intelectuais e de ex-militantes da esquerda armada. Contou, também, com a rejeição quase absoluta do Partido Comunista Brasileiro. O velho partidão que veio a falecer antes mesmo que o Muro de Berlim ruísse, sem conseguir sua principal meta: organizar os liberais para que fizessem a revolução burguesa. Talvez por cacoete, nascido dessa aproximação tática, muitos sobreviventes tornaram-se força auxiliar da direita e, juntos, fizeram de Lula o principal adversário. Pura reação do fracasso. Afinal, ao dar vigor ao capitalismo brasileiro, Lula fez, ao modo dele, o que os comunistas brasileiros tentavam. Há um conteúdo revolucionário nesse processo.

Para entrar no seletivo “Clube de Eleitos” de ex-presidentes, era um concorrente absolutamente improvável. Recebeu “bola preta” dos eleitores por três vezes. Por preconceito, o clube só dava acesso, pelo voto popular, a quem tinha diploma universitário ou espada de general. Quando Lula foi eleito, em 2002, aquele círculo restrito de ex-presidentes, em 103 anos de República, era composto de 12 advogados, dois militares, um médico, um economista e um sociólogo.

Agora o “Clube de Eleitos” terá um torneiro-mecânico como associado, que, mais do que ex-presidente, tornou-se um protagonista brasileiro no século XXI.

Foi esse presidente-operário que tirou muitos milhões da miséria absoluta. Impôs uma política externa altiva para o País e, principalmente, criou um novo parâmetro no processo de desenvolvimento do Brasil: é possível crescer distribuindo renda.

O pior de Lula talvez tenha sido o fim total de algumas ilusões, seguido pelo aprendizado dos truques políticos, naturais do poder, sobre os quais nunca falará publicamente porque, em geral, nos horroriza. Mas foi isso, certamente, que surpreendeu os adversários: esperavam que o presidente “chutasse o balde” e perdesse o controle da base de apoio na sociedade que o elegeu e no Congresso também escolhido pela sociedade.

Em 2005, durante o episódio conhecido como “mensalão”, resistiu ao “golpe branco” tramado pela oposição e armado em dois lances: o impeachment fracassado, seguido de igual fracasso da pressão persuasória para fazê-lo desistir do segundo mandato.

Lula não se rendeu à principal perversão do poder: o continuísmo além da regra. Há evidências, ainda agora, dos momentos de ambiguidade que viveu: sair ou ficar?

Superar a vontade de continuar dá a dimensão humana da decisão que tomou.

Gilberto Carvalho morde a isca da mídia

Reproduzo artigo de Antônio Mello, postado em seu blog:

Alguém pode pedir para o ex-chefe de gabinete do presidente Lula e atual secretário-geral da presidenta Dilma, Gilberto Carvalho, parar de dar entrevistas? Será que só ele não percebe que está sendo instrumentalizado pela mídia de oposição para sequestrar a presidenta Dilma?

Quantas entrevistas Carvalho deu nos oito anos do governo Lula? Pois só agora foram ao menos duas, uma para O Globo e outra publicada hoje na Folha. Ambas batendo na mesma tecla, a possibilidade da volta de Lula, caso o governo Dilma não dê certo.

O objetivo da mídia oposicionista é claro: sequestrar a presidenta Dilma Rousseff, fazê-la refém, para que ela haja de acordo com seus [da mídia] interesses, que foram derrotados nas urnas.

Em entrevista publicada na Caros Amigos, a professora Marilena Chauí denuncia a forma de agir da mídia:

*****

Quando se percebeu que a possibilidade de vitória da Dilma era grande, e havia as pesquisas de opinião sobre o governo e sobre o próprio Lula, a mídia, e quem começou isso foi a própria Globo com uma clareza... Ela começou a produzir a figura mítica do Lula. E é através da mitificação da figura do Lula que se vai, agora, falar da Dilma. Então, eu diria que é preciso fazer operar juntos o tratamento dado à Dilma com a mudança no tratamento dado ao Lula: “Isso é o Lula, isso é o mito do Lula, ela não vai poder, porque isso é o Lula que é capaz.” Isso é o analfabeto beberrão.

Durante oito anos era o analfabeto beberrão, que agora é o mito político inigualável que ninguém é capaz de alcançar. Mas, ao lado disso, você tem o que? Durante oito anos, nós tivemos que aguentar que era um problema o Lula aparecer nos lugares os mais diferentes e improvisar. Tinha mania de improvisar os discursos e aí dizia muita bobagem. Quanta bobagem ele disse por causa de improvisar. Então, Dilma ganha e vai à televisão, leva um discurso e lê. O que você vê nos comentadores da televisão, nos comentadores do rádio e no dia seguinte nos jornais? “Ah, não tem a capacidade de improviso do Lula, ela precisa ler, coitada, tudo dela é preparado... Você vê, ela teve que vir preparada, ela não é capaz de improvisar.”

Eu tinha vontade de atravessar os fios eletrônicos e bater nas pessoas, porque chegou num grau de perversidade, num sentido psicanalítico do termo. No nível do discurso, não dá mais, porque quando você vira na direção da perversão, a primeira característica da perversão é a de que ela é impermeável ao discurso. O grande problema da terapia psicanalítica na hora em que ela é impermeável ao discurso, porque a psicanálise opera no nível da linguagem. E você tem um evento que está ou aquém ou além do discurso. Então, a perversidade e a perversão dos comentários sobre o fato de ela ter o discurso escrito foi tal que eu falei: Já temos aqui o que serão os próximos quatro anos. Os próximos quatro anos vão ser um inferno como foram os oito do Lula, e sobretudo os quatro primeiro anos do Lula. Vai ser um inferno e não tem jeito.

*****

E o Gilberto Carvalho joga na mesma direção. Hoje, na entrevista à Folha (aqui, no Blog do Favre), ele diz:

*****

Qual é [a área que o preocupa]? É a política?

A política, na medida em que não temos o peso definidor da figura do Lula, a capacidade de sedução que ele exerceu. A Dilma não tem naturalmente essa relação. Vamos ter que construir.

O sr. disse, em entrevista, que, se houvesse dificuldades, o Lula poderia voltar. Levou bronca?

Falei a coisa mais óbvia. Acho que o governo da Dilma será de muita competência. Se Deus quiser, faremos um belíssimo governo e ela será reeleita. É evidente que, se não der certo, temos um curinga. Estou dizendo para a oposição: “Calma. Não se agitem demais. Temos uma carga pesada. Não brinca muito que a gente traz. É ter o Pelé no banco de reservas”.

Que dificuldade pode existir?

Tenho até medo de falar e se tornar uma profecia ruim. Mas digamos que haja uma dificuldade na gestão, na economia, algum acidente, por exemplo, na economia do mundo.

*****

A presidenta Dilma não precisa de tutela. Ela foi eleita com nossos votos por ser quem é. Esse negócio de ameaçar com volta de Lula é machismo. Tentam fazer com ela o mesmo que com Lula em seu primeiro governo, quando diziam que ele precisava ser auxiliado, ouvir os tucanos para não trazer o caos ao país.

Mas a mídia que apostou contra Lula e agora tenta sequestrar Dilma vai quebrar a cara mais uma vez. Basta ver sua história de vida para perceber que ela não foge à luta.

Os saudosos de Lula, especialmente Gilberto Carvalho, devem aprender a lição de Oswald de Andrade: “O meu relógio anda sempre para a frente. A História também.”. Se na eleição de 2006, o mote foi “Deixa o homem trabalhar”, agora é “Deixa o homem descansar”.

A presidenta do Brasil é Dilma Rousseff.

A barreira da desigualdade

Reproduzo artigo de professor Fábio Konder Comparato, publicado na revista CartaCapital:

A ligação entre democracia e direitos humanos é visceral, pois trata-se de realidades intimamente correlacionadas. Sem democracia, os direitos humanos, notadamente os econômicos e sociais, nunca são adequadamente respeitados, porque a realização de tais direitos implica a redução substancial do poder da minoria rica que domina o País. Como ninguém pode desconhecer, sem erradicar a pobreza e a marginalização social, com a concomitante redução das desigualdades sociais e regionais, como manda a Constituição (art. 3º, III), é impossível fazer funcionar regularmente o regime democrático, pois a maioria pobre é continuamente esmagada pela minoria rica.

Acontece que o nosso País continua a ostentar a faixa de campeão da desigualdade social na América Latina, e permanece há décadas entre os primeiros colocados mundiais nessa indecente competição. Em seu último relatório, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Humano (PNUD) mostrou que os setores de mais acentuada desigualdade social, no Brasil, são os de rendimento e educação.

É óbvio que essa realidade deprimente jamais será corrigida simplesmente com a adoção de programas assistenciais do tipo Bolsa Família. Trata-se de um problema global, ligado à estrutura de poder na sociedade. Para solucioná-lo, portanto, é indispensável usar de um remédio também global. Ele consiste na progressiva introdução de um autêntico regime republicano e democrático entre nós. Ou seja, no respeito integral à supremacia do bem comum do povo (a res publica romana) sobre o interesse próprio das classes e dos grupos dominantes e seus aliados. Ora, se a finalidade última do exercício do poder político é essa, fica evidente que ao povo, e a ele só, deve ser atribuída uma soberania efetiva e não meramente simbólica, como sempre aconteceu entre nós.

Para alcançar esse desiderato, é preciso transformar a mentalidade dominante, moldada na passiva aceitação do poder oligárquico e capitalista. O que implica um esforço prolongado e metódico de educação cívica.

Concomitantemente, é indispensável introduzir algumas instituições de decisão democrática em nossa organização constitucional. Três delas me parecem essenciais com esse objetivo, porque provocam, além do enfraquecimento progressivo do poder oligárquico, a desejada pedagogia política popular.

A primeira e mais importante consiste em extinguir o poder de controle, pelo oligopólio empresarial, da parte mais desenvolvida dos nossos meios de comunicação de massa. É graças a esse domínio da grande imprensa, do rádio e da televisão, que os grupos oligárquicos defendem, livremente, a sua dominação política e econômica.

O novo governo federal deveria começar, nesse campo, pela apresentação de projetos de lei, que deem efetividade às normas constitucionais proibidoras do monopólio e do oligopólio dos meios de comunicação de massa, e que exigem, na programação das emissoras de rádio e televisão, seja dada preferência a finalidades educativas, artísticas e informativas, bem como à promoção da cultura nacional e regional.

A esse respeito, já foram ajuizadas no Supremo Tribunal Federal algumas ações diretas de inconstitucionalidade por omissão. É de se esperar que a nova presidente, valendo-se do fato de que o Advogado-Geral da União é legalmente “submetido à sua direta, pessoal e imediata supervisão” (Lei Complementar nº 73, de 1993, art. 3º, § 1º), dê-lhe instruções precisas para que se manifeste favoravelmente aos pedidos ajuizados. Seria, com efeito, mais um estrondoso vexame se a presidente eleita repetisse o comportamento do governo Lula, que instruiu a Advocacia–Geral da União a se pronunciar, no Supremo Tribunal Federal, a favor da anistia dos assassinos, torturadores e estupradores do regime militar.

As outras duas medidas institucionais de instauração da democracia entre nós são: 1. A livre utilização, pelo povo, de plebiscitos e referendos, bem como a facilitação da iniciativa popular de projetos de lei e a criação da iniciativa popular de emendas constitucionais. 2. A instituição do referendo revocatório de mandatos eletivos (recall), pelos quais o povo pode destituir livremente aqueles que elegeu, sem necessidade dos processos cavilosos de impeachment.

Salvo no tocante à iniciativa popular de emendas constitucionais, já existem proposições em tramitação no Congresso Nacional a esse respeito, redigidas pelo autor destas linhas e encampadas pelo Conselho Federal da OAB: os Projetos de Lei nº 4.718 na Câmara dos Deputados e nº 001/2006 no Senado Federal, bem como a proposta de Emenda Constitucional 073/2005 no Senado Federal. Recentemente, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou a proposta de Emenda Constitucional nº 26/2006, apresentada pelo senador Sérgio Zambiasi, que permite a iniciativa popular de plebiscitos e referendos.

Mas não sejamos ingênuos. Todos esses mecanismos institucionais abalam a soberania dos grupos oligárquicos e, como é óbvio, sua introdução será por eles combatida de todas as maneiras, sobretudo pela pressão sufocante do poder econômico. Se quisermos avançar nesse terreno minado, é preciso ter pertinácia, organização e competência.

Está posto, aí, o grande desafio a ser enfrentado pelo futuro governo federal. Terá ele coragem e determinação para atuar em favor da democracia e dos direitos humanos, ou preferirá seguir o caminho sinuoso e covarde da permanente conciliação com os donos do poder?

É a pergunta que ora faço à presidente eleita.

Battisti e as bravatas de Berlusconi

Reproduzo artigo de Altamiro Borges, postado no Blog do Miro

Silvio Berlusconi, o primeiro-ministro neofascista da Itália, decidiu esbanjar arrogância contra o governo brasileiro após o anúncio da não extradição do ativista Cesare Battisti. Ontem (2), o bravateiro anunciou que vai recorrer ao Tribunal de Haia para anular a decisão soberana do Brasil. Seu ministro das Relações Exteriores, Franco Frattini, também enviou uma carta à presidente Dilma Rousseff solicitando que ela “reconsidere a decisão do seu antecessor”.

Nela, em tom de provocação, o governo italiano afirma que está decidido a utilizar “todas as vias” para conseguir a extradição de Battisti. Segundo as agências internacionais de noticia, Silvio Berlusconi já teria encaminhado à Câmara dos Deputados o pedido de congelamento de um acordo de colaboração econômica entre Itália e Brasil que deveria ser ratificado em janeiro. Ele previa o empréstimo ao Brasil de 5 bilhões de euros (US$ 6,7 bilhões) para a compra de naves, mísseis e radares. A mídia italiana, quase totalmente controlada pelo “imperador” Berlusconi, estimula todos os dias o ódio contra a decisão do governo brasileiro.

Um neofascista corrupto

Toda esta onda de bravatas, que atemoriza a mídia colonizada do Brasil, só evidencia a fraqueza do governo neofascista da Itália. Silvio Berlusconi não está com esta bola toda – e não deveria ser levado muito a sério. No mês passado, ele quase foi apeado do cargo. “Sobreviveu por margem estreita a uma moção de não-confiança, que deixou seu governo de centro-direita agarrado ao poder por apenas três votos de diferença”, noticiou O Globo em 14 de dezembro – o mesmo jornal que agora aplaude a postura "enérgica" do primeiro-ministro. Nas ruas das principais cidades italianas, milhares de jovens pedem a sua cabeça diariamente.

Berlusconi, que gosta de se jactar por suas orgias, inclusive com menores de idade, é acusado de vários crimes – remessa ilegal de divisas, desvio de recursos públicos, sonegação fiscal, entre outros. Apontado como o 15º homem mais rico de planeta e o maior milionário da Itália, ele concentra uma fortuna estimada em US$ 20 bilhões – a maior parte dela sob investigação da Justiça. O notório corrupto, que já foi condenado várias vezes, só mantém sua força eleitoral graças, entre outros fatores, ao seu poder midiático. Desde 1974, quando comprou seu primeiro canal de televisão, ele passou a controlar os meios de comunicação do país.

O imperador da mídia

“Em pouco tempo, ele expandiu o seu domínio no setor, multiplicando suas emissoras através de uma rede de televisões locais, reunidas na empresa Mediaset. A programação era centrada em concursos e programas de entretenimento, semelhante à do brasileiro Sílvio Santos. Em 1985, o governo francês lhe concedeu a primeira rede privada daquele país, La Cinq, e adquiriu ações da Chain e Cinema 5. Um ano depois comprou os Estúdios Roma e o clube de futebol A. C. Milan, do qual tornou-se presidente. Em 1988 comprou a maior cadeia de grandes armazéns da Itália, La Standa”.

“Em 26 de janeiro de 1990 obteve a presidência do grupo Mondadori, editor do diário "La Repubblica" e dos semanários "L'espresso", "Época" e "Panorama". No final da década, Berlusconi incorporou a seu patrimônio a cadeia de vídeos Blockbuster, portais de acesso à internet e uma participação na Olivetti. O conglomerado Fininvest, que criou em 1975, cumpriu a função de integrar suas múltiplas propriedades e participações na TV, imprensa, edições, publicidade, seguros e serviços financeiros, convertendo-se na terceira empresa privada do país”, descreve o portal UOL, numa rápida biografia que agora a Folha omite.

O cinismo de Berlusconi

No caso da não extradição de Cesare Battisti, o primeiro-ministro neofascista também esbanja bravatas. Ele tenta salvar seu decrépito governo com novos factóides, revivendo os piores instintos do período da “guerra fria” para alimentar falsos sentimentos nacionalistas. O seu cinismo é descarado. Há cerca de 50 foragidos italianos com pedidos de extradição em várias partes do mundo, mas a sua gritaria é seletiva. Ele persegue ativistas de esquerda e agride governos progressistas, como o de Lula, mas não mexe um dedo pela extradição de famosos terroristas de direita.

Um caso emblemático envolve Delfo Zorzi, 62 anos, ex-líder da seita neofascista “Ordine Nuovo”, que promoveu, nos anos 60 e 70, inúmeros atentados à bomba, “beneficiando-se da proteção do serviço secreto italiano que, por sua vez, tinha ligações com as ‘operações encobertas’ da CIA no país”. A agência dos EUA implantou na Itália, na década de 50, uma rede clandestina chamada “Gládio” para realizar atentados e organizar milícias armadas. Zorzi foi condenado em primeiro grau, e depois absolvido, pelo atentado da Piazza Fontana, em Milão, em 1969, que resultou em 17 mortos e 84 feridos. Atualmente, está sendo processado pelo atentado em Brescia, em 1974, contra uma manifestação sindical antifascista, que causou oito mortes e mais de 90 feridos.

Protetor dos agentes da CIA

Zorzi vive há anos no Japão, onde se naturalizou e tornou-se um rico empresário do setor têxtil. O pedido de extradição feito ao Japão jamais foi atendido, nem o governo italiano fez muito para isso. Detalhe: o defensor de Zorzi é o advogado (e deputado do ‘Forza Itália’, partido do governo) Gaetano Pecorrella, que vem a ser também um dos advogados pessoais do próprio Berlusconi. Outro detalhe: vários ex-integrantes do ‘Ordine Nuovo’ são hoje militantes da AN (partido herdeiro do neofascista do Movimento Sociale Italiano – MSI) e da ‘Lega Nord’, um partido xenófobo. NA e Lega são aliados de Berlusconi e integram seu governo.

Num caso mais recente, que também evidência o cinismo do primeiro-ministro, juízes de Milão solicitaram, em 2006, a extradição de 26 agentes da CIA que seqüestraram o egípcio Abu Omar, acusado de ligações com Al Qaeda. Ele foi uma das vítimas da “extraordinary renditions”, as prisões ilegais efetuadas pela CIA durante a “guerra global contra o terror” patrocinada pelo ex-presidente Bush. Omar foi detido ilegalmente na Itália e torturado durante meses em prisões clandestinas. Pela lei italiana, o seqüestro é considerado uma grave violação do código penal do país e da convenção européia dos direitos humanos, que proíbe prisões ilegais e torturas. Mas o governo italiano não moveu uma palha para obter a extradição dos agentes da CIA.

Bernardo enquadra teles: quer banda larga a R$ 30

Reproduzo artigo de Paulo Henrique Amorim, postado no site Conversa Afiada

Do Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, ao Valor, pág. A7:

“ Acredito que as empresas (teles) tenham a decisão estratégica no Brasil de fornecer serviços caros para pouca gente … é uma visão curta. Posso vender mais barato e ganhar na escala.”
“Este ano foram vendidos 13 milhões de computadores no Brasil.”
“A Telebrás é um instrumento que reativamos com a visão de que vamos fazer uma estrutura de rede e nos associar com o setor privado, que pode ser as teles ou simplesmente os provedores e conteúdo.”
“Queremos que a banda larga seja popularizada. Fala-se em R$ 30, R$ 35. Acho que é razoável. Com isso, podemos massificar.”



Eis aí uma bela diferença da Dilma para o Lula.

Os ministros das Comunicações do Lula mantinham com a Globo relações de cordial camaradagem.

O Senador Evandro Guimarães, diretor da Globo em Brasília, tratava os ministros pelo primeiro nome, numa nice, como diria o Padim Pade Cerra.

O Helio Costa, então, era a sopa no mel.

Além de ser muito simpático à Globo, ele era também extremamente simpático às teles.

Uma questão de estilo.

Ser simpático.

O Paulo Bernardo mudou o jogo.

Na primeira entrevista de Ministro, chama as teles às falas:

1) O Brasil não é mais o Brasil do Faoro: um Brasil de 20 milhões de pessoas.

Onde se ganhava na margem e não no volume.

Agora, o Alemão também conta.

2) Bernardo fez a conta de traz pra frente.

Primeiro, diz quanto quer cobrar: R$ 30, R$ 35.

Depois, chama as teles.

Se houver alguma dúvida, a Telebrás está atrás da porta e, como diz ele, “leva o serviço aos rincões”.

Ao Alemão.

Em tempo: Bernardo também fala da próxima entrada das teles na tevê por assinatura.

As teles faturam 13, 14 vezes mais que as tevês. Se ficarem sozinhas, engoliriam as tevês.

Mas, elas vão poder prover conteúdo, segundo a PL 116 que está no Senado.

A banda larga a R$ 30 e tevê por assinatura sem o monopólio da Globo são novidades que explicam por que os filhos do Roberto Marinho – eles não têm nome próprio - não foram à posse da Dilma

Paulo Henrique Amorim

A torcida para que Lula abandone a política

Reproduzo artigo de Luiz Carlos Azenha, publicado no blog Viomundo:

Eles não descansam nunca. Primeiro, lá atrás, bem antes da eleição, eles diziam assim: Lula não fez nada, apenas não mexeu no governo Fernando Henrique que, para todos os efeitos, continua. Ou: Lula teve sorte, pegou uma conjuntura internacional favorável e apenas surfou nela (pré-crise econômica mundial). Mas os argumentos para desmerecer Lula e seu governo não pararam por aí. Lula não redistribuiu renda, apenas “transferiu” renda do governo para os mais pobres (este é o favorito da esquerda que a direita ama).

Depois que Lula escolheu Dilma, os argumentos passaram a ser: quem é este poste? O poste não dá conta. O poste não vence eleição. Vejam o caso do Chile, o poder de transferência de votos de Lula é limitado.

Com Dilma eleita, mudou o disco: não existe governo Dilma, Lula dá muito palpite, Lula está indicando ministro, ainda não ouvimos a voz de Dilma.

Com Dilma empossada, agora o disco é: Lula não consegue deixar o palácio, Lula não consegue se aposentar, Lula quer voltar em 2014. O objetivo, neste momento, é óbvio: tirar Lula do jogo político para enfraquecer Dilma.

Se um presidente fracassado como FHC continua na política, por que Lula se aposentaria?

Isenção da mídia, essa desvalida

Reproduzo artigo de Washington Araújo, publicado no Observatório da Imprensa:

A novidade veio dar à praia/ Na qualidade rara de sereia/ Metade o busto de uma deusa maia/ Metade um grande rabo de baleia/ A novidade era o máximo/ Do paradoxo escondido na areia/ Alguns a desejar seus beijos de deusa/ Outros a desejar seu rabo pra ceia. [A novidade (Gilberto Gil/ João Barone/ Herbert Viana/ Bi Ribeiro)]

Um presidente da República tem muitas coisas a fazer no exercício de seu mandato. Dentre estas, há que ter tempo para falar com a população que o elegeu. No caso atual do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em fim de mandato, com avaliação positiva extrapolando em muito o histórico de índices coletados em pesquisas de opinião pública – variando entre 80-86% de ótimo/bom – essa mediação ocorre não apenas da forma tradicional – a que é mediada pela grande imprensa –, mas também pelo estilo peculiaríssimo do presidente que, longe de se ater à pauta nascida no eixo Rio-São Paulo, desponta onde ele estiver, pois é ele próprio quem faz soar o diapasão e leva ao noticiário o que entende ser de interesse da maioria da população.

Coletivas de imprensa com o presidente nos trazem a certeza de que veremos os rostos daqueles que se especializaram em dar vazão, ao longo dos anos, a todo tipo de avaliação negativa de seu governo. São esses rostos que emolduram colunas de jornais e revistas, que conduzem a voz de comentaristas que se consideram sempre mais sábios que o próprio presidente quando o assunto é governar o país e que, a bem da verdade, insistem em se considerar sempre mais inteligentes e perspicazes que o resto do nosso contingente populacional. Como diria minha caçula Lara (12): "São os que estão sempre `se achando´."

Nas coletivas, logo os identificamos pela voz. Aparecem com muita regularidade em emissoras de rádio e de televisão, quase sempre ferozes, como aquele guarda que torce para que o motorista não veja o sinal de trânsito e assim possa lhe aplicar, com redobrada satisfação, pesada multa. São editoriais que carregam nos adjetivos que agridem e que se sustentam em insinuações quase sempre além do tom jornalístico.

Debate desfocado

A verdade é que nossos comentaristas de política e economia são incansáveis no ofício de aconselhar o presidente da República sobre todo e qualquer assunto: desde a nomeação de alguém para o Supremo Tribunal Federal até sua maneira de passear... com as emas nos jardins do Alvorada. Com a passagem do tempo, tornaram-se, mesmo sem se dar conta, especialistas em encontrar diariamente, ao menos, sete erros nas atitudes, falas e ações dessa personalíssima figura que teve seu nome escolhido pela expressa maioria da população brasileira. É pena que não se deem conta do papel ridículo que quase diariamente desempenham ante milhares (ou milhões?) de leitores, ouvintes e telespectadores, que desperdiçam nacos de tempo se inteirando de suas opiniões. Opiniões que, diante das seguidas pesquisas feitas pelo Vox Populi, Ibope e Datafolha, parecem estar sempre na contramão do sentimento popular quando o assunto é a avaliação do governo ou da pessoa do presidente.

O fato é que o presidente da República soube ocupar todo o espaço midiático que lhe era oferecido e outro espaço talvez de maior tamanho, aquele que conquistou com seu carisma, ar bonachão, frases de efeito, metáforas ao gosto popular e indiscutível pendor para transformar meros atos de governo em eventos quase sempre adequados aos holofotes dos meios de comunicação. O presidente Lula fez isso sem qualquer afetação porque soube ser senhor absoluto de suas relações com a imprensa. Por mais que nossa grande imprensa tentasse – uma e mil vezes – cobri-lo de ridículo, ele sempre conseguiu se desvencilhar das muitas armadilhas e, não raras vezes, aprisionou seus pretensos juízes da liberdade de expressão em figuras menores do nosso jornalismo.

É fato também que o presidente Lula poucas vezes deixou de revidar quando se sentiu atacado pela imprensa e, ao contrário do que se esperava, soube expressar de forma cabal seu descontentamento e raiva no rastro de outras fortes emoções. O presidente tampouco deixou se intimidar com acusações de que semeava ódio à imprensa e ameaçava a liberdade de expressão. Porque sempre considerou este debate inoportuno e desfocado, "coisa de quem adora misturar alhos com bugalhos".

Atentado ao figurino

Dentro de poucos dias, Luiz Inácio Lula da Silva deixará de ser presidente mas seu estilo inconfundível como presidente continuará ainda por muito tempo no imaginário da nação. Qualquer comentário seu dificilmente deixará de repercutir por haver deixado de ser presidente da República. E, como já está ocorrendo, comentaristas e analistas de política continuarão dando a Lula o peso midiático que ele conquistou. Ao fazer isso, jornalistas apenas confirmam que os gestos, as falas e até os gostos de Lula impactam a audiência que termina sendo parte preponderante da sociedade, alcançando a base da pirâmide e também seu cume.

É certo que, assim como a noite segue o dia, a grande imprensa passará boa parte de seu tempo criando intrigas entre a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula. Qualquer vírgula fora do lugar na relação dos dois poderá assumir o tamanho de pico da Neblina. Qualquer discordância entre os dois assumirá ares de consumada traição por parte da criatura que até bem pouco tempo era jejuna de eleições e que recebeu nas urnas votação consagradora para se tornar a primeira mulher a assumir a suprema magistratura no Brasil.

A partir do primeiro dia de 2011, tudo leva a crer que teremos um Lula mais falante – se é que isto é possível –, um cidadão mais livre para dizer o que pensa – se é que isto também possível – e sem o queixume de sempre de nossos colegas da imprensa de que "o presidente voltou a se portar de forma incompatível com o cargo de presidente". O patrulhamento agora mudará de eixo. Não importa como o futuro ex-presidente falar ou agir, será sempre atentado violento ao figurino que a imprensa criou para enquadrá-lo – agora fora do centro do poder político nacional. Será a forma como a grande imprensa encontrará para jogar mais luz sobre seu sempre prendado antecessor Fernando Henrique Cardoso.

Sabedoria popular

Criticar é próprio do jornalismo. Melhor, é próprio do bom jornalismo. Jornalismo acrítico não é jornalismo, é simulacro, é qualquer outra coisa – menos jornalismo. Mas há que saber criticar. Sim, criticar não é apenas escrever desaforos na certeza de que não terá resposta à altura (o agredido nunca consegue condições equânimes para responder na medida ao ataque desferido), nem significa tão somente vociferar contra toda e qualquer política pública. Criticar exige responsabilidade e algumas outras virtudes que, por ausentes nos últimos tempos, parecem soterradas em velhos manuais de redação, não obstante estes circularem a cada ano em edição novinha em folha. Criticar não é apenas abrir a caixa de ferramentas onde guardamos toda espécie de juízo de valor. Criticar exige de quem o faz buscar a sempre fugidia isenção, aquela quase etérea imparcialidade de quem sabe separar o que é fato e o que é notícia do que é suposição ou apenas atende a reclames de natureza político-ideológica.

Um dos problemas do jornalismo é a enorme distância entre a teoria e a sua prática. Tem a ver com a forma com que nos relacionamos com isenção e imparcialidade na abordagem de um tema ou de um simples fato. Ora, é certo que não vai se conseguir isenção completa na abordagem de um tema, principalmente aqueles de natureza política, de Estado, de governo. É óbvio que será algo de todo inatingível. O mesmo posso assegurar quanto à busca da imparcialidade: tirem o cavalinho da chuva porque ninguém consegue tornar indivisível a mistura de política com imparcialidade. Mas tem que se buscar ao menos um pouco de isenção, de saber ver os diversos aspectos envolvidos, de estar receptivo ao contraditório.

Um pouco de isenção é possível, sim. E quanto menos isento é o jornalista, menos credibilidade desfruta junto à sociedade. É verdade também que para determinados jornalistas isenção é palavra tão desconhecida quanto seu equivalente russo, osvobozhdenie. Porque isenção é algo que se recusa a passar por nosso filtro ideológico e moral. E não precisamos explicar a uma pessoa porque gostamos tanto do vermelho e mostramos desapreço pelo marrom que ela, sem qualquer esforço nosso, no momento certo, saberá de nossas preferências. Sejam cores, sejam partidos políticos, sejam autores prediletos, sejam cidades ou mesmo alimentos e seus temperos, tudo passa por gostos pessoais. Por isso, o senso comum consagrou máximas e expressões como "Cada cabeça, uma sentença", "Cada um tem o nariz que tem", "O que seria do amarelo se todos gostassem apenas do azul?"

Cidadania e a pluralidade

O mesmo acontece com o jornalismo. Lendo apenas uma coluna de Merval Pereira, sabemos logo onde ele quer chegar. Escutando um só comentário de Lucia Hippolito, descobrimos pela entonação da voz, pelo muxoxo, pelo esgar, pelo arremedo de tosse, pelo pigarro destoante, que ideia ela realmente luta por repercutir. Lendo não mais que uma linha de alguns comentaristas de Veja, sempre tão prolíficos em girar em torno de si mesmos, parece que já lemos centenas de seus textos, seja pela repetição ilimitada de frases, seja pela contundência, no mais das vezes absolutamente deslocadas.

Existem outros ainda que nem mesmo precisam enunciar a primeira palavra para sabermos a construção que virá em seguida, de forma acabada, bem amarrada, mesmo que sem nexo com a realidade. Refiro-me ao jornalista William Waack e ao dublê de cineasta e comentarista Arnaldo Jabor. São jornalistas que imprimem aos fatos elevada carga de opinião, quase sempre extremada, e que nos levam a decidir por emoções igualmente extremadas: amamos ou odiamos. O mesmo acontece com os editoriais da revista Veja e da revista CartaCapital. Se formos atentos, saberemos, logo de início, para onde correm tantas palavras em desabalada profusão.

De qualquer forma, o pior tipo de jornalismo é aquele que sufoca e que considera normal – normalíssimo, até – falsear os fatos. E que assim age de forma deliberada, pensada. É aquele jornalismo que, longe de informar, deseja atuar como luz da consciência alheia, apresentando a notícia apenas pelo ângulo que lhe apetece ou que vem confirmar sua sapiência do assunto. Temos infinidade de exemplos desse tipo de jornalismo porque este encontrou no Brasil campo propício para se alastrar. Prolifera como erva daninha ou, para usar uma expressão que gosto muito, "transborda como plantação de cogumelo".

Basta analisar distraidamente a seção Cartas dos Leitores para ver, com raras e importantes exceções (e a Folha de S.Paulo sai bem nessa foto) que a seleção das cartas prima pelo jacobinismo explícito e desbragado. São cartas autoreferentes, autoelogiosas, autolaudatórias. Não seria muito melhor contratar um ou dois estagiários para escrever tais textos adulatórios? Nos blogues da internet é a mesma coisa: figurinhas carimbadas que cobrem política nacional são useiras e vezeiras no uso sistemático da tesoura que poda comentários minimamente contrários à sua opinião. É como se esses blogueiros, alguns com coluna fixa nos grandes jornais do Rio e de São Paulo, dissessem repetidamente: "Se vocês desejam ser elogiados tratem logo de criar seus próprios espaços. Façam como eu, que criei o meu espaço e aqui só publico o que quero, o que gosto, o que encontra ressonância em meu pensamento". Arrisco-me a prever que não tarda a chegar o tempo em que os excessos praticados por um jornalismo majoritariamente opinativo será sucedido por outro jornalismo, bem mais comprometido com a cidadania e com a pluralidade de pensamento.

Feliz 2011 para todos os que ousam desejar da novidade nada menos que "seus beijos de deusa" ou que se contentariam em "desejar seu rabo pra ceia".

domingo, 2 de janeiro de 2011

Rádios comunitárias crescem na Venezuela

Reproduzo artigo de Renan Justi e Maísa Tomaz, publicado no sítio Comunique-se:

“Nós somos a expressão da liberdade”, define Carlos Lugo, coordenador da rádio Negro Libre Primero (101,1 FM), numa manhã de domingo em Caracas. É com este espírito ideológico que as mais de 244 rádios comunitárias da Venezuela atuam, acreditando na força do meio de comunicação para promover a tão desejada transformação socialista no país.

Desde o fracassado golpe de Estado promovido pela oposição em 2002, o ex-general militar Hugo Chávez difunde sua ideologia política, principalmente, pelos meios de comunicação públicos, como o jornal Ciudad CSS, a emissora Telesur, a Radio Nacional de Venezuela, entre outros.

Rádios comunitárias

O processo “revolucionário”, que, segundo os chavistas, a Venezuela atravessa, tem apoio massivo das rádios comunitárias, com transmissão sustentada pelo eleitorado mais fervoroso do presidente, as classes baixas.

Estas rádios comunitárias, em grande parte, possuem como principal objetivo a propagação dos ideais socialistas do bolivarianismo, os quais se valem da concepção de que os países latino-americanos devem emancipar-se da dependência do capital norte-americano e europeu, nações que, na visão de Hugo Chávez, exploram a classe trabalhadora por intermédio das super lucrativas multinacionais.

“Nós somos revolucionários, acreditamos que para construir uma sociedade mais justa há de se trabalhar, formar as pessoas, nos prepararmos. Neste momento, apoiamos o projeto do presidente Chávez porque, ainda que não seja o governo que sonhamos, é o que mais se assemelha ao que sempre nós sonhamos”, declara o coordenador editorial Yaarabid Gomez, da rádio Ali Primera (98.3 FM).

O fato é que, na prática, as comunidades adquiriram voz própria e liberdade para comunicar não apenas os ideais socialistas do bolivarianismo, mas também o que é de interesse coletivo do bairro. A rádio tornou-se um meio alternativo que na sua essência socialista transcende o simples “informar”, ela surge como uma necessidade de comunicação entre os moradores, como é a história da Negro Libre Primero, localizada em um antigo prédio de três andares na periferia de Caracas.

“No ano de 2002, em meio ao golpe de Estado e greve do petróleo, o cidadão pobre que vinha a este posto (à frente da rádio) não poderia comprar a gasolina barata ou comprar o gás na bodega da esquina. Todos estes elementos a oligarquia mandou fechar, e as pessoas não sabiam onde poderiam buscar estes produtos. Foi então que começamos a perceber que estávamos sem comunicação”, relembra o também apresentador Carlos Lugo.

Outras iniciativas

Para quem é morador da comunidade La Candelaria, onde é sintonizada a Negro Libre Primero, existe o que eles chamam de processo de desenvolvimento social. Graças à rádio, a comunidade dispõe de iniciativas sociais e projetos de capacitação profissional. “Estes cursos (carpintaria, construção e costura) são preparatórios para estabelecermos grandes redes coletivas, onde todos podem compartilhar e ser donos daquilo que produzimos”, declara Lugo.

As novas instalações da rádio mostram que o próximo passo, como já está sendo construído, será a criação de uma padaria e açougue dentro do prédio da rádio, onde as pessoas irão aprender a produzir o que elas precisam consumir e, inclusive, adquirir mantimentos por preços menores, desprendendo-se do consumismo capitalista.

A moradora do bairro, Pátria América Zapata, que participa das aulas de costura, busca no passado a explicação para o processo “revolucionário-socialista” que a Venezuela chavista almeja há tanto tempo. “Estamos aqui hoje, data 9 de outubro, dia importante para todos, morte de Ernesto Che Guevara. E aqui, na rádio, enquanto abrimos estes projetos de formação e capacitação, fazemos honra a Che.” E complementa sobre o ambiente de igualdade: “O bom daqui é que todos sabemos e todos vamos aprender”, afirma Zapata.

Conteúdo colaborativo

Como decreta o governo ao sancionar a livre atuação dos meios alternativos (Lei Orgânica de Telecomunicação, de 2000), o conteúdo dos programas exibidos nas rádios é decidido de forma participativa entre quaisquer membros engajados da comunidade e produtores, construindo-se um laço de identificação com o material que vai ao ar.

É com base nesta lei que a rádio Perola (92.3 FM), instalada no piso térreo de um prédio residencial, define sua linha editorial. Sua programação é produzida com responsabilidade, centralizada nas questões que envolvem o bem social de quem vive no bairro Caricuao. Um exemplo é o programa “Em Família”, apresentado por Cristel Arrellano, funcionária do Ministério da Educação da Venezuela, que orienta os pais sobre como melhorar a qualidade de vida da população infantil, abordando temas ligados à saúde e educação.

A iniciativa de organizar um programa com estes temas surgiu a partir do alto número de jovens grávidas que despontou na comunidade. “Temos anos e anos lutando e trabalhando por isto, que para nós significa um projeto de vida, um sonho realizado por ajudar muitíssimas pessoas que não tem tantas alternativas”, revela Arellano.

Meio alternativo

Um fator decisivo para o nascimento das rádios comunitárias foi a falta de identificação com os meios de comunicação privados, por não se sentirem representados por um conteúdo produzido pelas classes mais abastadas. “Hoje e ontem, os meios de comunicação privados tentam monopolizar as rádios. Surgimos, então, por uma necessidade de sermos escutados, das pessoas poderem dizer o que pensam, afinal, as comunidades também têm o direito de expressar-se sem comercializar o meio”, diz Marcos Flores, colaborador da Perola, sobre a democratização comunicacional do país.

Embora haja apoio incontestável dos meios comunitários às campanhas do presidente Chávez, mantido no poder há 12 anos, não há qualquer recompensa financeira por parte do governo. O sustento da rádio Ali Primera, montada dentro da Universidade Simón Rodriguez, é sacado do bolso de cada produtor, que colaboram mensalmente com 20 bolívares fortes, o equivalente a 8 reais. O coordenador Yaarabid esclarece este procedimento ao ilustrar como eles, moradores do bairro El Valle, conseguiram dinheiro para um novo equipamento. “Aqui sequer fazemos publicidade institucional. Em 2002, o CD player da rádio foi danificado e tivemos que vender nossa moto para comprar um novo”, revela.

Se as recentes eleições legislativas, em setembro, na Venezuela apontaram uma queda de prestígio do partido de Chávez (PSUV) perante os venezuelanos, Yaarabid mantém um discurso fiel e coerente à ética socialista, mas com ressalvas. “Nós acreditamos neste processo revolucionário porque estamos comprometidos com o próprio princípio moral, nossa forma de pensar, independente se Chávez preste algum apoio econômico”, finaliza.

Tucanos se bicam: Alckmin isola Serra

Reproduzo artigo de Altamiro Borges, postado no Blog do Miro

Na rápida solenidade de posse no Palácio dos Bandeirantes, Geraldo Alckmin, que governará São Paulo pela terceira vez, deve ter deixado encafifado José Serra, que ainda curte nas madrugadas a derrota na eleição presidencial. Em seu pronunciamento de 23 minutos, ele afirmou que “vamos ter com a presidente Dilma a melhor das relações”. Até a Folha de S. Paulo, palanque do demotucano na disputa eleitoral, registrou o incomodo:

“Geraldo Alckmin assumiu o governo de São Paulo personificando o novo discurso do PSDB. Ontem, em sua posse, defendeu o legado da sigla, mas pregou ‘inovação’, com ênfase em políticas sociais, além de parceria com Dilma Rousseff... A ênfase na cooperação entre governos e o foco em políticas sociais presentes no discurso de Alckmin coincidem com a teoria da refundação da sigla, do senador eleito Aécio Neves (PSDB-MG)... Ontem, a promessa de colaboração com o governo federal foi feita diante do ex-governador José Serra (PSDB)”.

Sinais na montagem do secretariado

Há vários sinais de que o novo governador descarta o desleal concorrente do seu próprio partido. Na disputa pela prefeitura da capital paulista, em 2006, Serra rifou o PSDB, deixou Alckmin pendurado na brocha e bancou o demo Gilberto Kassab. A convivência, que já não era boa, azedou de vez. Na seqüência, ambos tentaram manter as aparências. Serra até convidou o “traído” para o seu secretariado. Mas os dois tucanos não se bicam – ou melhor, se bicam.

Na montagem do seu secretariado, Alckmin já demonstrou que quer distância dos serristas. Ela nomeou tucanos que ficaram com ele na disputa interna do partido. É o caso de Edson Aparecido, um aliado histórico, e de Andrea Matarazzo. Este é amigo de Serra, mas foi um dos poucos tucanos que não seguiu as ordens do chefão autoritário e apoiou Alckmin na eleição para prefeitura da capital paulista.

“Maior obstáculo” ao PSDB

Prova maior deste distanciamento, porém, foi a indicação de dois aliados de Gabriel Chalita, que rompeu com o PSDB e se elegeu deputado federal pelo PSB. Durante a campanha presidencial, o ex-tucano ajudou a comandar a campanha de Dilma e foi um dos mais ácidos críticos de Serra. Chalita é tido como um inimigo pelos serristas, mas influenciou a nomeação dos secretários da Educação (Herman Voowald) e do Desenvolvimento Social (Paulo Alexandre) do governo Alckmin.

Com esses lances, o novo governador de São Paulo sinaliza que deseja se projetar no PSDB e isolar o rival, que ainda insiste em ser candidato em 2014. Como observou o próprio Estadão, Serra é visto hoje por vários analistas políticos como o “maior obstáculo para a reorganização do PSDB”. O partido está sem discurso e sem norte. Elegeu seis governadores, que devem adotar uma postura pragmática diante do governo federal, e viu sua bancada federal ser reduzida de 65 para 53 deputados. Alckmin sabe que precisa virar essa página e não está disposto a alimentar cobras.