terça-feira, 26 de julho de 2011

Serra quer peitar Lula em 2014. Surtou!

Por Altamiro Borges, em seu blog.

Josias de Souza é bem enturmado no ninho tucano. Na semana passada, talvez com base numa conversa reservada, ele descreveu quais deverão ser os próximos passos de José Serra, o candidato do PSDB que já levou duas surras de Lula – em 2002 e 2010. Se não for mera especulação, a conclusão é que o tucano surtou de vez. Notívago conhecido, ele precisa dormir urgentemente!

Segundo o blog do Josias, hospedado no UOL, Serra está “decidido a disputar pela terceira vez” as eleições presidenciais e avalia que seu antagonista será Lula, e não Dilma. Ele também “desdenha da tese segundo a qual Aécio Neves tornou-se a bola da vez do tucanato. Em privado, Serra acalenta a expectativa de que Aécio não se animará a medir forças com o PT se o oponente for Lula”.

A arrogância do rejeitado

“Entre quatro paredes, Serra declara que tudo o que deseja é um novo confronto eleitoral com Lula. Nos dois embates anteriores, ele levou a pior. Em 2002, perdeu para o próprio Lula. Em 2010, foi batido pela candidata de Lula, uma Dilma novata em urnas. Serra acredita que o PSDB não terá como desprezar os 43,7 milhões de votos que ele obteve no ano passado”.

Ainda segundo o blogueiro preferido da famiglia Frias, que repercute as bravatas do tucano, Dilma não será candidata à reeleição por duas razões: sua gestão será um fracasso e Lula deseja voltar ao poder. “Na opinião de Serra, os primeiros seis meses de Dilma foram marcados pelo desperdício de tempo”. Ela teria se rendido à herança maldita de Lula e às mesquinharias partidárias.

“Discurso mais incisivo” contra Dilma

“Por todas essas razões, Serra defende internamente que a oposição escale sobre Dilma, adotando, desde logo, um discurso mais incisivo”, conclui o relato do papo amigável. Para o blogueiro, porém, a situação do tucano não é nada fácil. “Contra a vontade de Serra conspiram os fatos. Formou-se dentro do PSDB uma densa maioria pró-Aécio”.

Alguns veículos serristas, em especial a Folha, até gostariam que o ex-governador de São Paulo reunisse melhores condições para enfrentar a disputa presidencial de 2014. Ele representa a elite paulista e defende os seus interesses. O mineiro Aécio Neves, até mais conservador, é um “bom moço”, mas expressa outro bloco de poder e pode ser alvo do bafômetro e de outras blitz policiais.

Humilhado e derrotado no PSDB

Mas a situação de Serra é lamentável. Ele não sofreu apenas uma derrota eleitoral em 2010. Ele se desmoralizou politicamente, jogou a sua rala biografia no lixo. Oportunista, ele se aliou com o que há de mais reacionário na política nativa – da TFP e Opus Dei aos milicos saudosos da ditadura. O seu discurso direitista se parece com o manifesto racista do terrorista da Noruega.

Passadas das eleições, como bagaço imprestável, Serra foi rejeitado pelo seu próprio partido. Ele foi humilhado e derrotado nas disputas para os comandos nacional e estadual do PSDB; seus seguidores foram despachados do Palácio dos Bandeirantes, numa vingança maligna de Alckmin; a sua cria na capital paulista, Gilberto Kassab, destroçou o DEM e fragilizou a oposição demotucana.

Serra ainda tenta esbanjar valentia. Na conversa intima com Josias de Souza, ele arrota que quer um novo confronto com Lula, jacta-se dos 43 milhões de votos. Mas é pura bravata. Ele não consegue apoio nem para um documento em nome do tal conselho do PSDB. Ele já foi descartado pela elite. Caso tenha interesse funcional, poderá, no máximo, disputar a prefeitura em 2012.

Regulação da mídia empaca no governo

Por André Barrocal, no sítio Carta Maior:

A descoberta de que um jornal britânico do bilionário Rupert Murdoch grampeava pessoas de forma clandestina reacendeu a discussão sobre os limites éticos e legais dos meios de comunicação. No Brasil, este tipo de debate vai esquentar sob patrocínio do governo federal, que prepara um novo marco regulatório para emissoras de TV e rádio, orientadas até hoje por uma legislação dos anos 60, e uma lei para a internet.



As duas propostas, contudo, estão em estágios diferentes. Enquanto a primeira ainda não tem data para ficar pronta - e pode até ser submetida a uma consulta pública pelo Ministério das Comunicações, - a segunda só depende de um aval da presidenta Dilma Rousseff, para ser enviada ao Congresso na volta do recesso parlamentar, em agosto.

Preparado pelo ministério da Justiça, o chamado “marco civil da internet” vai garantir, segundo Carta Maior apurou, algo vital para quem gosta de usar a internet para fazer militância política ou contestar o noticiário de TVs e rádios: a neutralidade da rede. Será proibido que empresas provedoras de acesso à internet façam qualquer tipo de filtro do conteúdo dos usuários.

O texto começou a ser elaborado pelo governo em 2009, porque os parlamentares estavam prestes a aprovar uma lei - ainda hoje parada no Congresso - que classifica como crimes certas práticas de internautas. Batizado pelos inimigos de “AI-5 digital”, em referência ao ato institucional mais famoso e violento da ditadura militar, o projeto é criticado, entre outras razões, por tentar punir os usuários antes de direitos deles estarem bem definidos em lei.

O governo entrou na briga ao lado dos adversários do “AI-5 digital”, pedindo ao Congresso que não votasse a criminalização antes do “marco civil” chegar à Casa, o que ocorrerá em breve.

Regulação de TVs e rádios

No caso do marco regulatório da radiodifusão, não existe a mesma perspectiva.

A decisão de propor ao Congresso uma nova legislação para TVs e rádios havia sido tomada pelo ex-presidente Lula. Mas, por falta de tempo, o projeto não foi concluído no mandato dele e ficou para a gestão sucessora, que o lista como prioridade na área de comunicações, mas ainda não tem prazo para enviá-lo aos parlamentares.

Encarregado de fechar um texto para apresentar à presidenta, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, adotou uma postura cautelosa, por entender que a proposta, por si só, vai gerar muita polêmica no Congresso, dada a predisposição negativa das empresas de TV e rádio.

Ele recebeu no dia 8 de janeiro uma espécie de pré-projeto deixado pelo ministro da Comunicação Social de Lula, Franklin Martins, que comandara o debate em 2010. Desde então, a equipe de Bernardo submete a minuta ao que o ministro chama de “pente-fino”. E cogita colocá-la, ao menos em parte, em consulta pública. O objetivo, segundo ele, é evitar que o projeto tenha uma redação que dê aos inimigos da ideia argumentos para dizer que se trata, no fundo, de uma tentativa de amordaçar a mídia.

No segundo encontro nacional dos blogueiros progressistas, realizado em Brasília em meados de junho, Bernardo foi explícito sobre sua preocupação. “O governo acha [o marco regulatório] extremamente importante. Mas temos sido zelosos porque [o projeto] está marcado como censura”, afirmara na ocasião. “Parte da mídia faz críticas ácidas e hostis. Não gosta nem de ouvir falar [em regulação]. Quando mandarmos ao Congresso, vai ser uma briga danada.”

Os defensores do marco regulatório temem que “o pente-fino” de Bernardo, no fim, descaracterize o espírito original da proposta: submeter emissoras de TV e rádio, que são concessões públicas, a regras de regulação como acontece em outras áreas em que também há concessões, como energia elétrica ou telefonia.

O marco não tratará de jornais e revistas, que o governo considera que são empresas privadas como outras quaisquer.

ANP rebate acusações da revista Época

Do sítio da Agência Nacional de Petróleo (ANP):

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) repele, energicamente, as acusações feitas pela Revista Época em reportagem de capa da edição de 23/7/2011. A revista veiculou falsidades e desconsiderou dados verdadeiros que já lhe tinham sido informados há dois anos. Generaliza suas aleivosias irresponsáveis e agride toda a comunidade que trabalha na Agência. Em respeito a seus servidores e à sociedade, a ANP presta os seguintes esclarecimentos:

* Os Srs. Antonio José Moreira e Daniel Carvalho, que aparecem na gravação e foto divulgadas e foram apresentados na reportagem como “assessores da ANP”, nunca foram assessores desta Agência. Nunca foram sequer do quadro de servidores permanentes, nem ocuparam cargos comissionados que lhes permitissem representar a ANP. Antonio José Moreira é procurador federal e foi removido por concurso para acompanhamento de processos da Agência, como ocorre em outros órgãos públicos. Daniel Carvalho foi estagiário na ANP em 2008 e depois trabalhou em prestadora de serviços à ANP, sem vínculo empregatício com a Agência. Além disso, a revista maldosamente os apresenta como se estivessem hoje na ANP, sendo que ambos já estão fora desta Instituição há mais de dois anos.

* A Época teve acesso à gravação há mais de dois anos e enviou e-mail com perguntas sobre o assunto em 9/4/2009.

* A reportagem também não informa que, tendo tomado conhecimento em 2009 da gravação referida na matéria, um funcionário da Assessoria de Inteligência da própria ANP acompanhou a advogada Vanuza Sampaio ao Ministério Público para a apresentação da denúncia, ficando claro que a ANP estaria, como permanece até agora, à disposição para os esclarecimentos necessários.

* Essas informações, que a reportagem ignora, tinham sido fornecidas pela ANP à Época em abril de 2009.

* O ex-superintendente de Abastecimento da ANP Edson Silva interpelou judicialmente, em 2009, a advogada Vanuza Sampaio, no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, através do advogado Valmir Batista, ex-presidente da seccional da OAB no Rio Grande do Sul, para que confirmasse em juízo as acusações agora veiculadas pela revista. Em sua resposta, a advogada negou que tivesse conhecimento de qualquer irregularidade por ele praticada.

* Edson Silva afirma que jamais autorizou quem quer que seja a falar em seu nome ou fazer tratativas do tipo que a revista lhe atribui e nega que tenha havido qualquer encontro em um "café nas cercanias da sede da ANP, no centro do Rio", como consta na reportagem.

* A ANP nunca teve conhecimento de qualquer irregularidade praticada pelo ex-superintendente de Abastecimento Roberto Ardenghy.

* As insinuações feitas por Época contra o ex-diretor Victor Martins merecem também repulsa e protesto, vez que a Revista Época volta a se apoiar em denúncias levantadas há anos e que foram consideradas falsas, depois de ampla investigação por uma CPI do Senado Federal.

* Ao contrário do que afirma a Revista, a ANP não se exime de fiscalizar ou tolera irregularidades no mercado de combustíveis. A prova maior disso é a qualidade dos combustíveis brasileiros, que estão de acordo com os melhores padrões mundiais. Qualidade resultante do rígido controle exercido pela ANP, o qual envolve operações regulares de fiscalização realizadas em coordenação com o Ministério Público, órgãos estaduais e municipais.

* Quanto à acusação de aparelhamento político, a Revista Época ignora que o quadro permanente de servidores da ANP só foi constituído na atual administração, por meio de dois concursos públicos que permitiram a contratação de mais de 650 servidores concursados. São profissionais capacitados, que servem à sociedade com dedicação e correção, não sendo merecedores do tratamento ofensivo que lhes foi dispensado pela Revista.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

O complexo de vira-lata da elite nativa

Por Celso Amorim, na revista CartaCapital:

Até os jornais brasileiros tiveram de noticiar. Uma força-tarefa criada pelo Conselho de Relações Exteriores, organização estreitamente ligada ao establishment político/intelectual/empresarial dos Estados Unidos, acaba de publicar um relatório exclusivamente dedicado ao Brasil - pontuado de elogios e manifestações de respeito e consideração. Fizeram parte da força-tarefa um ex-ministro da Energia, um ex-subsecretário de Estado e personalidades destacadas do mundo acadêmico e empresarial, além de integrantes de think tanks, homens e mulheres de alto conceito, muitos dos quais estiveram em governos norte-americanos, tanto democratas quanto republicanos.



O texto do relatório abarca cerca de 80 páginas, se descontarmos as notas biográficas dos integrantes da comissão, o índice, agradecimentos etc. Nelas são analisados vários aspectos da economia, da evolução sociopolítica e do relacionamento externo do Brasil, com natural ênfase nas relações com os EUA. Vou ater-me aqui apenas àqueles aspectos que dizem respeito fundamentalmente ao nosso relacionamento internacional.

Logo na introdução, ao justificar a escolha do Brasil como foco do considerável esforço de pesquisa e reflexão colocado no empreendimento, os autores assinalam: “O Brasil é e será uma força integral na evolução de um mundo multipolar”. E segue, no resumo das conclusões, que vêm detalhadas nos capítulos subsequentes: “A Força Tarefa (em maiúscula no original) recomenda que os responsáveis pelas políticas (policy makers) dos Estados Unidos reconheçam a posição do Brasil como um ator global”.

Em virtude da ascensão do Brasil, os autores consideram que é preciso que os EUA alterem sua visão da região como um todo e busquem uma relação conosco que seja “mais ampla e mais madura”. Em recomendação dirigida aos dois países, pregam que a cooperação e “as inevitáveis discordâncias sejam tratadas com respeito e tolerância”. Chegam mesmo a dizer, para provável espanto dos nossos “especialistas” – aqueles que são geralmente convocados pela grande mídia para “explicar” os fracassos da política externa brasileira dos últimos anos – que os EUA deverão ajustar-se (sic) a um Brasil mais afirmativo e independente.

Todos esses raciocínios e constatações desembocam em duas recomendações práticas. Por um lado, o relatório sugere que tanto no Departamento de Estado quanto no poderoso Conselho de Segurança Nacional se proceda a reformas institucionais que deem mais foco ao Brasil, distinguindo-o do contexto regional. Por outro (que surpresa para os céticos de plantão!), a força-tarefa “recomenda" que a administração Obama endosse plenamente o Brasil como um membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas. É curioso notar que mesmo aqueles que expressaram uma opinião discordante e defenderam o apoio morno que Obama estendeu ao Brasil durante sua recente visita sentiram necessidade de justificar essa posição de uma forma peculiar.

Talvez de modo não totalmente sincero, mas de qualquer forma significativo (a hipocrisia, segundo a lição de La Rochefoucault, é a homenagem que o vício paga à virtude), alegam que seria necessária uma preparação prévia ao anúncio de apoio tanto junto a países da região quanto junto ao Congresso. Esse argumento foi, aliás, demolido por David Rothkopf na versão eletrônica da revista Foreign Policy um dia depois da divulgação do relatório. E o empenho em não parecerem meros espíritos de porco leva essas vozes discordantes a afirmar que “a ausência de uma preparação prévia adequada pode prejudicar o êxito do apoio norte-americano ao pleito do Brasil de um posto permanente (no Conselho de Segurança)”.

Seguem-se, ao longo do texto, comentários detalhados sobre a atuação do Brasil em foros multilaterais, da OMC à Conferência do Clima, passando pela criação da Unasul, com referências bem embasadas sobre o Ibas, o BRICS, iniciativas em relação à África e aos países árabes. Mesmo em relação ao Oriente Médio, questão em que a força dos lobbies se faz sentir mesmo no mais independente dos think tanks, as reservas quanto à atuação do Brasil são apresentadas do ponto de vista de um suposto interesse em evitar diluir nossas credenciais para negociar outros itens da agenda internacional. Também nesse caso houve uma “opinião discordante”, que defendeu maior proatividade do Brasil na conturbada região.

Em resumo, mesmo assinalando algumas diferenças que o relatório recomenda sejam tratadas com respeito e tolerância, que abismo entre a visão dos insuspeitos membros da comissão do conselho norte-americanos - e aquela defendida por parte da nossa elite, que insiste em ver o Brasil como um país pequeno (ou, no máximo, para usar o conceito empregado por alguns especialistas, “médio”), que não deve se atrever a contrariar a superpotência remanescente ou se meter em assuntos que não são de sua alçada ou estão além da sua capacidade. Como se a Paz mundial não fosse do nosso interesse ou nada pudéssemos fazer para ajudar a mantê-la ou obtê-la.

O jornalismo industrial-militar de Murdoch

Por Robert C. Koehler, no sítio Carta Maior:

De repente ficou claro para todo mundo. Grampear o celular de uma adolescente desaparecida? Deletar chamadas, interferir na busca desesperada por seu paradeiro?

Fazer grampo de telefones das vítimas de terrorismo, de soldados mortos? Que tipo de cultura de sala de redação poderia valorizar fofocas sobre a intimidade das pessoas, obtidas de modo tão indefensável e lamentável? Que tipo de organização chamaria a isto de “notícias”? Mesmo aqueles dentre nós que há muito se enojam com a marca Murdoch tiveram seu momento de choque diante desta notícia, deixando o cinismo de lado e cedendo.
Parece que alguma coisa se mostrou aberta e exposta, à medida que os detalhes vinham à tona: não apenas a falta de ética, mas uma destituição ética absoluta em seu desprezo por nossas vidas. E esse desrespeito é o fundamento de um império midiático. Murdoch não é somente um traficante sórdido. É uma das pessoas mais ricas e poderosas no planeta – e tem uma agenda política que lhe importa mais, eu imagino, do que um bilhão qualquer em dinheiro, aqui ou ali.

A silenciosa virulência de sua influência nos acontecimentos públicos, mais do que manchetes sensacionalistas e escândalos e o comércio da calúnia que inflige sobre nós é minha verdadeira preocupação.

Tão grande como Murdoch é nos EUA, com sua rede de propaganda de direita Fox News, ele é na Grã Bretanha, onde é mais poderoso que a família real. “Ele é frequentemente referido como o membro permanente do país no Gabinete [do Primeiro Ministro]”, escreveu Beth Fouhy recentemente para a Associated Press. Desde a época de Margareth Tatcher ele tem sido o poderoso chefão dos primeiro ministros britânicos, capaz de lhes oferecer coisas que estes não puderam recusar. Quando o escândalo dos grampos foi jogado no ventilador, David Cameron, o atual primeiro ministro, vem lutando para desligar sua imagem da de Murdoch.

Mas não há escapatória para o fato de que o ex-porta voz de Cameron, Andy Coulson, foi editor de jornalismo do jornal News of the World antes de se juntar à equipe do primeiro ministro e uma das 10 pessoas presas no caso. Eu não sei se o império de Murdoch, a News Corp, emergirá do escândalo intacta e virulenta como nunca ou se terá de ser renomeada para News Corpse [cadáver] (pode-se apenas torcer para que isso ocorra). Mas a explosão de suas operações é um momento chocante o suficiente para nos ensinar, uma chance para se repensar o papel dos jornalistas e o sentido das notícias.

Como ponto de partida, eu situo lado a lado os dois extremos da exagerada influência de Murdoch em nossas vidas, nossos políticos e nossas ideias a respeito de nós mesmos. O que deu origem ao escândalo foi a revelação, pelo repórter do Guardian, Nick Davies, de que funcionários do News of the World tinham grampeado o telefone de Milly Dowler, uma menina de 13 anos que foi sequestrada próximo de Londres, na volta para casa da escola, em 2002. Meses depois, seu corpo foi descoberto; ela teria sido assassinada. Antes dessa descoberta, quando só havia o temor insuportável e a esperança louca dos familiares e amigos de Milly, os subordinados de Murdoch minaram a tragédia, valorizando seu aspecto sexual, futricando as pitadas de “interesse humano” para ostentar em seu jornal.

Este é o jornalismo completamente devotado à compaixão humana – jornalismo, eu diria, do lado errado da raça humana. A coisa tem interesse zero em contribuir para uma sociedade informada ou para criar coesão social. É junk food tóxica, um tipo bizarro de “reality” show de abastecimento dos expectadores entediados e isolados, com nenhum outro propósito que mantê-los consumindo o produto. Isso tornou Murdoch rico além da conta. Eis aqui o outro extremo: da história de Fouhy, da AP, descrevendo a influência de Murdoch na política britânica: “Murdoch teria mudado sua relação de apoio a Tony Blair, o Primeiro Ministro de 1997 a 2007. Blair telefonou para Murdoch repetidas vezes antes de comprometer as tropas britânicas na guerra do Iraque, em 2003, a qual foi fortemente apoiada pelos jornais de Murdoch em todo o mundo”. Para mim, isso aumenta esse escândalo milhões de vezes. Aqui está um chefe de estado democraticamente eleito articulando com seu benfeitor secreto para trazer a guerra ao planeta.

Este é o jornalismo industrial-militar, é o conluio na guerra para fazer dinheiro, manipulando políticos de acordo com o seu interesse no fortalecimento de seu sucesso financeiro, ao espalhar a sordidez. O vazio ético de Murdoch não é limitado por seu império midiático trash. Ele é um player na paz e na guerra. Esse é um jornalismo fora de controle – o oposto exato da ideia de minha profissão. Em vez de manter uma relação adversária frente ao poder e representar os interesses daqueles de fora da sua esfera, mantém uma relação adversária com a humanidade. No Mundo de Murdoch, somos todos abstrações, quer tenhamos um nome (Milly Dowler) ou meramente uma marca de identificação massiva (os iraquianos). O jornalismo pode se dirigir ao poder, tornar-se seu cachorrinho e até, como as revelações da News Corpse tem demonstrado, tornar-se o próprio poder, um ditador por trás das cenas ou dos acontecimentos, manipulando o mundo segundo os seus próprios interesses.

Mas os verdadeiros jornalistas espalham o poder ao dizerem a verdade, como Davies e o The Guardian tomaram a frente nas revelações sobre o News of the World. Esse escândalo, finalmente, não é sobre Murdoch, mas sobre todos os que praticam o ofício do jornalismo. Chegou o momento de nos perguntarmos: de quem, afinal, somos aliados?

* Tradução de Katarina Peixoto.

Chacina na Noruega e o "pessoal do Cerra"

Por Paulo Henrique Amorim, no blog Conversa Afiada:

O autor do atentado em Oslo, na Noruega, se diz fundamentalista cristão, contra os imigrantes, e membro de uma organização de extrema direita.

Algumas das vítimas participavam de um encontro de uma organização de trabalhistas.

Nos Estados Unidos, o New York Times fez imediatamente essa leitura política do gesto enlouquecido e deixou claro que se tratava de um cristão de extrema direita.

O que, associado à xenofobia, pode contaminar a Europa.

O El País da Espanha enfatiza o caráter xenófobo, antimuçulmano do assassino.

Na página da BBC online, se sabe:

O assassino participava de um fórum neonazista na internet.

Ele acredita que os muçulmanos querem colonizar a Europa Ocidental.

E culpa as idéias “multiculturalistas” e do “Marxismo cultural” por incentivar isso.

Para ele não há um único país em que muçulmanos vivam em paz com não-muçulmanos.

E isso sempre tem consequências catastróficas, diz ele.

Ele se considera cristão, conservador, adepto da musculação e da Maçonaria.

É fã do presidente russo Vladimir Putin.

Nos Estados Unidos, esse extremismo de direita, xenófobo, se acolhe no leito macio no movimento Tea Party que tem como símbolo mais exuberante, hoje, a deputada republicana por Minnesota, Michele Bachmann.

Ela é homofóbica, xenófoba, não votará na ampliação do teto para endividamento dos Estados Unidos em hipótese alguma, considera o aquecimento global uma fraude, e acha que uma das opções para negociar com o Irã é jogar uma bomba atômica.

Bachmann pertence a uma denominação luterana e, com o marido, dirige uma clinica de aconselhamento psicológico, que, entre outras atividades comerciais, se propõe a converter homossexuais ao heterossexualismo.

Quem aqui no Brasil, segundo o professor Wanderley Guilherme dos Santos, se apropriou da doutrina da extrema direita?

Quem explorou o aborto e chamou o Papa para a campanha?

Quem foi a cultos evangélicos passar a mão da cabeça (a outra mão empunhava a Bíblia) de manifestantes homofóbicos?

Quem pôs nos bolivianos a culpa pela tragédia da cocaina e do crack?

Quem disse que a baixa qualidade da educação em São Paulo se deve aos “migrantes”?

Quem trouxe o Irã para a campanha presidencial e criticou uma política de envolvimento e negociação?

Quem foi ao Clube da Aeronáutica do Rio denunciar a marxista Dilma Roussef?

Quem?

É preciso dar nome aos bois.

Na Noruega, ele se chama Anders Behring Breivik.

Nos Estados Unidos, Michele Bachmann.

No Brasil, José Serra.

Inferno na Noruega é obra da direita

Por Flavio Aguiar, na Rede Brasil Atual:

Ainda não se sabe direito o que aconteceu (redijo esse post às 10h45 do sábado, 23, hora de Berlim, 05h45 em Brasília), mas já se sabe que foi à direita.

Primeiro, pelas 15h30 da tarde de sexta-feira, 22, uma bomba poderosíssima explodiu no centro de Oslo, matando 7 pessoas e ferindo gravemente dezenas.



Uma hora e meia/duas horas depois, um homem disfarçado de policial adentrou numa ilha (Utoya) perto da capital norueguesa. A ilha estava repleta de jovens: era um acampamento da juventude do Partido Trabalhista da Noruega, no governo. Neste sábado pela manhã o primeiro ministro noruguês deveria se dirigir a eles.

O suposto policial alegou estar averiguando a segurança da ilha, depois do atentado no centro da cidade. Chamou os jovens para perto de si. Quando vários atenderam o seu chamado, ele tirou pelo menos três armas da mochila e começou a atirar. Alguns dos jovens conseguiram chamar a polícia pelos celulares. Muitos correram para dentro d'água e começaram a nadar. Depois de fazer uma carnificina em terra, o "policial" foi para as margens e começou a atirar naqueles que estavam dentro d'água. Há uma foto na internet dele atirando, nesse momento, já cercado por cadáveres em terra. É horripilante.

Nesta manhã de sábado já foram encontrados 84 cadáveres na ilha, elevando o total de mortos para 91.

O suposto policial foi preso na ilha, e sua identidade (a polícia o trata como suspeito) revelada como sendo Anders Behring Breivik, de 32 anos. É caracterizado como "cristão-conservador", manifestou opiniões de extrema-direita, aqui na Europa ditas "nacionalistas", contra o "ïnternacionalismo multi-cultural". Até o momento não há indícios sobre outros participantes no atentado, embora seja difícil (mas não impossível) que ele tenha atuado sozinho. Nos últimos tempos trabalhava como chacareiro e dessa forma tinha acesso à compra de uma série de produtos químicos para fabricação de fertilizantes, que também poderiam ser usados para fabricar explosivos.

Não dá para dissociar os ataques do clima pesado que a direita vem semeando na Europa inteira, contra imigrantes, multi-culturalismo, Islã, islamismo, árabes, africanos e até latino-americanos, de rebarba. Essa pregação parte de e pode gerar desde políticos espertos e oportunistas, como Geert Wilders, da Holanda, pregadores burocráticos como Thylo Sarrazin, na Alemanha, partidos anti-europeus como o dos Verdadeiros Finlandeses (no governo), na Finlândia, líderes repressivos como Victor Orban (primeiro ministro e no ano que passou presidente da União Européia), da Hungria, e... fanáticos amalucados como Anders Behring. É de arrepiar.

O clima está pesado e temeroso na Europa inteira.

Ao mesmo tempo, devo assinalar esse fato singular. Ainda na sexta-feira, quando tudo era nebuloso no atentado (falava-se em apenas 4 mortos na ilha de Utoya), prestigioso periódico brasileiro publicou uma lista de possíveis grupos suspeitos pelo atentado: todos os nomes eram islâmicos.

Sem comentários.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

O Globo não publica respostas do MST

Do sítio do MST:

O jornal O Globo publicou uma reportagem no domingo para questionar por que os brasileiros não saem às ruas para protestar contra a corrupção.

Para fazer a matéria, os repórteres Jaqueline Falcão e Marcus Vinicius Gomes entrevistaram os organizadores das manifestações de defesa dos direitos dos homossexuais e da legalização da maconha. E a Coordenação Nacional do MST.

A repórter Jaqueline Falcão enviou as perguntas por correio eletrônico, que foram respondidas pela integrante da coordenação do MST, Marina dos Santos, e enviadas na quinta-feira em torno das 18h, dentro do prazo.

A repórter até então interessada não entrou mais em contato. A reportagem saiu só no domingo. E as respostas não foram aproveitadas.

Por que será?

Abaixo, leia as respostas da integrante da Coordenação Nacional do MST, Marina dos Santos, que não saíram em O Globo.

Por que o Brasil não sai às ruas contra a corrupção?

Arrisco uma tentativa de responder essa pergunta ampliando e diversificando o questionamento: por que o Brasil não sai às ruas para as questões políticas que definem os rumos do nosso país? O povo não saiu às ruas para protestar contra as privatizações – privataria – e a corrupção existente no governo FHC. Os casos foram numerosos - tanto é que substituiu-se o Procurador Geral da Republica pela figura do “Engavetador Geral da República”.

Não saiu às ruas quando o governo Lula liberou o plantio de sementes transgênicas, criou facilidades para o comércio de agrotóxicos e deu continuidade a uma política econômica que assegura lucros milionários ao sistema financeiro.

Os que querem que o povo vá as ruas para protestar contra o atual governo federal – ignorando a corrupção que viceja nos ninhos do tucanato - também querem ver o povo nas ruas, praças e campo fazendo política? Estão dispostos a chamar o povo para ir às ruas para exigir Reforma Agrária e Urbana, democratização dos meios de comunicação e a estatização do sistema financeiro?

O povo não é bobo. Não irá às ruas para atender ao chamado de alguns setores das elites porque sabe que a corrupção está entranhada na burguesia brasileira. Basta pedir a apuração e punição dos corruptores do setor privado junto ao estatal para que as vozes que se dizem combater a corrupção diminua, sensivelmente, em quantidade e intensidade.

Por que não vemos indignação contra a corrupção?

Há indignação sim. Mas essa indignação está, praticamente restrita à esfera individual, pessoal, de cada brasileiro. O poderio dos aparatos ideológicos do sistema e as políticas governamentais de cooptação, perseguição e repressão aos movimentos sociais, intensificadas nos governos neoliberais, fragilizaram os setores organizados da sociedade que tinham a capacidade de aglutinar a canalizar para as mobilizações populares as insatisfações que residem na esfera individual.

Esse cenário mudará. E povo voltará a fazer política nas ruas e, inclusive, para combater todas as práticas de corrupção, seja de que governo for. Quando isso ocorrer, alguns que querem ver o povo nas ruas agora assustados usarão seus azedos blogs para exigir que o povo seja tirado das ruas.

As multidões vão às ruas pela marcha da maconha, MST, Parada Gay...e por que não contra a corrupção?

Porque é preciso ter credibilidade junto ao povo para se fazer um chamamento popular. Ter o monopólio da mídia não é suficiente para determinar a vontade e ação do povo. Se fosse assim, os tucanos não perderiam uma eleição, o presidente Hugo Chávez não conseguiria mobilizar a multidão dos pobres em seu país e o governo Lula não terminaria seus dois mandatos com índices superiores a 80% de aprovação popular.

Os conluios de grupos partidários-políticos com a mídia, marcantes na legislação passada de estados importantes - como o de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul - mostraram-se eficazes para sufocar as denúncias de corrupção naqueles governos. Mas foram ineficazes na tentativa de que o povo não tomasse conhecimento da existência da corrupção. Logo, a credibilidade de ambos, mídia e políticos, ficou abalada.

A sensação é de impunidade?

Sim, há uma sensação de impunidade. Alguns bancos já foram condenados devolver milhões de reais porque cobraram ilegalmente taxas dos seus usuários. Isso não é uma espécie de roubo? Além da devolução do dinheiro, os responsáveis não deveriam responder criminalmente? Já pensou se a moda pegar: o assaltante é preso já na saída do banco, e tudo resolve coma devolução do dinheiro roubado...

O presidente da CBF, Ricardo Teixeira, em recente entrevista à Revista Piauí, disse abertamente: “em 2014, posso fazer a maldade que for. A maldade mais elástica, mais impensável, mais maquiavélica. Não dar credencial, proibir acesso, mudar horário de jogo. E sabe o que vai acontecer? Nada. Sabe por quê? Por que eu saio em 2015. E aí, acabou.(...) Só vou ficar preocupado, meu amor, quando sair no Jornal Nacional.”

Nada sintetiza melhor o sentimento de impunidade que sentem as elites brasileiras. Não temem e sentem um profundo desrespeito pelas instituições públicas. Teme apenas o poder de outro grupo privado com o qual mantêm estreitos vínculos, necessários para manter o controle sobre o futebol brasileiro.

São fatos como estes, dos bancos e do presidente da CBF – por coincidência, um dos bancos condenados a devolver o dinheiro dos usuários também financia a CBF - que acabam naturalizando a impunidade junto a população.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

A agenda para um espanhol indignado

Por Emir Sader, em seu blog:

O correspondente do jornal espanhol El País no Brasil não se conforma. Diz que não entende como aqui não há um movimento dos jovens indignados, como no seu país. Com tanta corrupção, diz ele, certamente leitor assíduo da velha mídia e menos da realidade concreta. Palocci, Ministério dos Transportes, processo do mensalão. Onde está a juventude brasileira? Perdeu a capacidade de se indignar? Está corrompida? Está envelhecida? Não tem os valores morais da juventude do velho continente?



Ele se indigna no lugar da nossa juventude, com um país carcomido pelos hábitos corruptores da velha politica populista e patrimonialista. Aderiu ao Cansei.

Dá pena. Ele não entende nem o nosso país, nem o dele. Acha que os jovens se indignam com a corrupção, na forma que a velha mídia a trata, como mercadoria de denúncia contra o Estado, a política, os governos, etc. etc.

Se comparasse a situação do seu país e do nosso poderia entender bem um ou até mesmo os dois países. Sugerimos uma agenda para sua visão obnubilada.

Por que não compara a popularidade do Zapatero com a do Lula? Por que será que um é enxotado – até mesmo por editorial do seu jornal, chegado ao PSOE, que diz que se ele quer fazer algo de vem pra Espanha, deve ir embora imediatamente – e o outro saiu do governo com 87% de popularidade e 4% de rejeição, mesmo tendo toda a mídia contra? O que é indignante: ter Zapatero como dirigente máximo do país ou a Lula?

Não lhe indigna saber que o seu país, que foi colonizador, se apropriando das riquezas produzidas pelos escravos neste país, que continua a explorar mediante os grandes bancos, petroleiras, companhias de telecomunicação a este continente, se encontra, há já quase 4 anos em crise. Enquanto nós, explorados, dominados, submetidos aos organismos internacionais que vocês apoiam, saímos a quase três anos da crise. Não lhe indigna isso?

Não lhe indigna que aqui todos os imigrantes podem se legalizar e ser tratados com igualdade de direitos, enquanto no seu país semanalmente chegam embarcações com centenas de pessoas provenientes da África – que vocês ajudaram a espoliar -, vários deles já mortos, e são presos e devolvidos a seu continente de origem, tratados como seres inferiores, rejeitados, humilhados e ofendidos?

Não lhe indigna que aqui, com muito menor quantidade de recursos, estamos próximos do pleno emprego, enquanto no seu país o desemprego bate recordes, chega a praticamente 50% para os jovens? Em condições que as elites ricas esbanjam dinheiro pelo mundo afora? Não lhe indigna isso?

Daria para continuar falando muito mais. Se lhe indignassem essas coisas, teria saído com os jovens espanhóis que continuam a ocupar ruas e praças, indignados, eles sim, com tudo isso que passa no seu país. Eles defendem os imigrantes, os desempregados, todos vítimas principais do governo que seu jornal apoiou até ontem.

Não lhe indigna que Lula seja um líder mundial, que vá à África propor medidas de luta contra a fome, enquanto o seu país rejeita os africanos e continua a explorar os recursos daquele continente?

Creio que, no fundo, o que indigna ao jornalista espanhol é que seu país perdeu a competição para sediar os Jogos Olímpicos, derrota com que não se conforma, então tenta desvalorizar o Rio e o Brasil, com denúncias reiteradas e multiplicadas sobre problemas de insegurança pública, de atraso nas obras da Copa e das Olimpíadas.

O que indigna é sua incapacidade de não compreender nem o seu país, nem o país sobre o qual ele deveria fazer cobertura que permitisse que os leitores compreendessem o Brasil. Mas ele não compreende sequer o seu país, como vai compreender o nosso?

É indignante realmente. Estivesse na Espanha, estaria com os jovens indignados, contra um governo como o que tem eles, com uma mídia como a que tem eles.

As guerras secretas de Obama

Por Manlio Dinucci, no sítio português O Diário:

A administração Obama está em processo de intensificação da guerra secreta em todas as suas variantes, o que inclui: a ação direta para destruir alvos, eliminar ou capturar inimigos; a guerra não convencional conduzida por forças externas, treinadas e organizadas pela USSOCOM; a contra-insurreição para ajudar os governos aliados a reprimir rebeliões; as operações psicológicas para influenciar a opinião pública estrangeira, a fim de apoiar as acções militares dos EUA. Estas operações são realizadas com base em tecnologias cada vez mais avançadas.


A crise económica empurra a Administração Obama no sentido de privilegiar a acção militar secreta, em detrimento de guerras convencionais. Também ela impulsionou as “operações militares especiais” a um nível jamais atingido. Dois grandes eixos de acção foram escolhidos: os assassinatos por drones, e a saturação dos meios de comunicação por redes organizadas de informadores fantasmas em países a desestabilizar.

Enquanto os raides aéreos sobre a Líbia atingem actualmente um total de 11.500 e o Secretário-Geral da NATO, Anders Fogh Rasmussen convida aliados para aumentar os gastos militares e um maior envolvimento na guerra, a guerra está-se espalhando na região do Oriente Médio e Norte Africano em formas menos visíveis mas não menos perigosas, abrindo constantemente novas frentes. A CIA - de acordo com uma agência oficial dos EUA citada pelo New York Times, está construindo uma base secreta no Oriente Médio para lançar ataques ao Iémen com drones armados. Estes são os Predator / Reaper (já em acção no Afeganistão, Paquistão e Líbia), armados com 14 mísseis Hellfire e telecomandados a partir de uma base em Nevada, a mais de 10.000 quilómetros de distância.

Desde que assumiu o cargo, “o presidente Obama aumentou drasticamente a campanha de bombardeamentos por parte da CIA no Paquistão, usando drones armados,” os mesmos que serão usados para “expandir a guerra no Iémen”. A administração considera-os “como a arma preferida para caçar e matar militantes dos países onde não é praticável uma forte presença militar dos EUA.”

No Iémen está actualmente em acção o Comando Supremo Conjunto de Operações Especiais (USSOCOM), assistido pela CIA e autorizado pelo Poder Executivo de Sana’a. Mas, dada a “fragilidade deste governo autoritário”, a administração Obama está preocupado com um futuro governo que não fosse capaz, ou estivesse disposto a apoiar as operações dos norte-americanos. Assim, ele encarregou a CIA de construir a base secreta numa localidade não identificada do Médio Oriente, se forma a empreender “acções secretas sem o apoio do governo anfitrião.”

Isto confirma que a administração Obama está em processo de intensificação da guerra secreta em todas as suas variantes. Como o declara oficialmente o USSOCOM, ela inclui: a acção directa para destruir alvos, eliminar ou capturar inimigos; guerra não convencional conduzida por forças externas, treinadas e organizadas pela USSOCOM; contra-insurreição para ajudar os governos aliados a reprimir rebeliões; operações psicológicas para influenciar a opinião pública estrangeira, a fim de apoiar as acções militares dos EUA. Estas operações são realizadas com base em tecnologias cada vez mais avançadas.

Entra neste quadro a decisão da administração Obama, tornada pública pelo New York Times, de criar à escala mundial ” redes sombra na Internet e telefone móvel que possam ser usadas por dissidentes para contornar a censura do governo.” O Pentágono e o Departamento de Estado investiram até agora nisso pelo menos 50 milhões de dólares. Estas redes são realizadas através de pequenas malas especiais que, uma vez introduzidas num determinado país, permitem comunicar com o exterior através de computadores e telefones portáteis, em modalidades wireless e codificadas, evitando controlos e proibições governamentais.

A motivação oficial de Washington é a de “defender a liberdade de expressão e de promoção da democracia.” As redes sombra, apenas fornecidas a grupos dissidentes úteis á estratégia dos EUA (Síria, Irão e outros países) e controladas por Washington, são os mais adequados meios para difundir na comunicação social informações fabricadas, para operações psicológicas que preparem a opinião pública para novas guerras.

O artigo indecente de Clóvis Rossi

Por Eduardo Guimarães, no Blog da Cidadania

A Folha de São Paulo passou a publicar “pornografia”. É literalmente indecente um artigo de um de seus principais pistoleiros publicado hoje (19/07) naquele antro de libidinagem intelectual. Se você não leu, tem que ler. Por penoso que seja ver um homem daquela idade se degradar tanto moralmente, o texto mostra a que ponto chegou essa gente.

Acredite quem quiser: ele escreveu um texto bradando contra a concentração da propriedade de meios de comunicação. Escreveu todos os argumentos que vimos escrevendo na blogosfera dia após dia, semana após semana, mês após mês, ano após ano. E colocou a culpa pela propriedade cruzada de meios de comunicação sabe em quem? No PT!

Leia e chore. Em seguida, um comentário final.



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FOLHA DE SÃO PAULO

19 de julho de 2011

Murdoch ou quando “Deus” fica nu

Clóvis Rossi

ED MILIBAND, líder do Partido Trabalhista britânico, tocou a tecla certa, em entrevista domingo ao “The Observer”: considerou “perigosa” a concentração da propriedade de meios de comunicação em poucas mãos, em alusão a Rupert Murdoch, o dono do império midiático hoje no centro de um imenso escândalo.

“Temos que ver o que fazer quando ocorrem casos em que uma pessoa controla mais de 20% do mercado de mídia”, disse Miliband durante a entrevista.

Bingo. Vale para o Reino Unido, vale para o Brasil, vale para o mundo. Aqui, tem sido “pouco saudável”, por exemplo, o domínio da família Magalhães sobre o principal jornal, a principal rádio e a retransmissora da Rede Globo na Bahia.

Diga-se o mesmo a respeito da família Sarney no Maranhão, bem como de outras famílias políticas em outros Estados, graças à farra de concessões de rádio e TV a políticos, tema de recente reportagem desta Folha.

É curioso que os petistas furibundos fizeram inúmeras tentativas de aprovar legislação sobre “controle da mídia”, mas que não tocavam no ponto chave que é a propriedade cruzada de meios de comunicação – capítulo que os Estados Unidos resolveram razoavelmente bem.

Controlar a mídia é tarefa do leitor/ouvinte/telespectador. Eu tenho horror ao sensacionalismo, mas sei muito bem que meu gosto é minoritário, no Brasil como no Reino Unido ou qualquer outro país.

Rupert Murdoch não tinha 2,7 milhões de capangas armados de metralhadoras para forçar os ingleses a esgotar a tiragem do “News of the World”.

Aliás, a propósito, vale reproduzir com uma ponta de orgulho corporativo a frase de Timothy Garton Ash, um dos intelectuais mais na moda na Europa, em seu artigo de ontem para “El País”: “O melhor jornalismo britânico pôs a nu o pior”, em alusão à incessante campanha do jornal ”Guardian” para expor as indecências do “NoW”.

Pois é, deixado livre, o melhor jornalismo acaba se impondo, por muito que demore.

Se controle da mídia é função do público, o da concentração excessiva é, aí sim, tarefa da legislação.

Ainda mais se a concentração fica nas mãos de alguém sem escrúpulos, que acaba impondo o reino do medo, que paralisa o mundo político.

É o caso de Rupert Murdoch, assim retratado ontem, no “Guardian”, pelo colunista Charlie Brooker: ”Poucas semanas atrás, Murdoch, ou, mais exatamente, as tendências mais selvagens da imprensa, representavam Deus. (…) Você nunca deve irritar Deus. Deus carrega imenso poder. Deus pode escutar tudo o que você diz. Você deve reverenciar Deus, e agradá-lo, ou Deus vai destrui-lo”.

Agora que “Deus” Murdoch está caindo em desgraça, o temor e as reverências deram lugar à constatações que deveriam ser óbvias há muito tempo, como a que fez Ed Miliband. E os “políticos britânicos fazem fila para denunciar Murdoch”, como completa Brooker.

O próprio “Guardian”, aliás, com o gostinho da vitória ainda fresco, pede a cabeça do primeiro-ministro David Cameron, por ter empregado Andy Coulson, ex-editor do “NoW”, como seu assessor de imprensa - típica atitude de quem queria comprar as graças de “Deus”.


crossi@uol.com.br

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Sim, isso foi publicado no jornal que estampou, em sua primeira página, uma ficha policial falsa da hoje presidente Dilma Rousseff e que divulgou acusação ao ex-presidente Lula de ser um maníaco sexual.

Por que será que esse velhaco não citou a Globo, da família Marinho, pela maior concentração de propriedade de meios de comunicação em todo o mundo? Ou o próprio grupo Folha, detentor de uma quantidade imoral de jornais e do maior portal de internet do país, um “grupo” que, em qualquer país civilizado, não poderia existir.

Ele acusa “petistas furibundos” de não pregarem o fim da concentração de meios de comunicação. Se tivesse saído de seu escritório com ar condicionado e ido cobrir a Conferência Nacional de Comunicação, em 2009, não teria ouvido falar de outra coisa. Inclusive, teria lido esse pleito antigo no documento final da Confecom.

Rossi mente descaradamente dizendo que “petistas furibundos” pregam controle dos meios de comunicação em vez de veto à propriedade cruzada, quando qualquer um que já tenha lido o que se pede dia sim, outro também em espaços como este sabe que é a democratização da comunicação, ou seja, o fim da propriedade cruzada.

Há quanto tempo você vê a blogosfera se esfalfar pedindo o fim da concentração de meios de comunicação? Como lidar com gente assim? Com luvas de pelica? Será que este governo não tem ninguém com um mísero traço de coragem para dar uma resposta à altura a esse velhaco? Até quando este país será esbofeteado dessa forma?

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Ivete Sangalo virou vidraça

Por Altamiro Borges, em seu blog

Em julho de 2007, a cantora Ivete Sangalo virou uma das estrelas do “movimento cívico pelo direito dos brasileiros”, mais conhecido pelo slogan Cansei. Aproveitando-se oportunisticamente da tragédia da TAM, direitistas convictos e ricaços famosos, tendo à frente João Dória Jr., tomaram a iniciativa para “condenar a desordem do governo federal”.

Os golpistas do Cansei

No ato de lançamento em São Paulo, a principal palavra de ordem foi o “Fora Lula”. O presidente foi apontado como culpado pelo acidente e por todos os males do país – em especial, pela corrupção. Líderes da oposição demotucana, mais sujos do que pau de galinheiro, apoiaram o movimento. Ivete Sangalo, Hebe Camargo, Regina Duarte e Ana Maria Braga tiveram as suas imagens estampadas em cartazes e folhetos para atrair populares ao protesto.

Os “cansados” não agüentaram o tranco por muito tempo. O movimento, logo identificado como uma iniciativa da direita hidrófoba e golpista, sucumbiu em pouco tempo. Segundo documentos vazados pelo Wikileaks, ele foi motivo de gozação até nas reuniões conspiratórias da embaixada dos EUA no Brasil. Algumas de suas estrelas, inclusive Ivete Sangalo, teriam se arrependido de participar daquela maquinação.

Investigação na Receita Federal

Mas o mundo é cruel. Agora é própria mídia demotucana, que alavancou o movimento, que levanta suspeita sobre os milionários negócios da famosa cantora. Reportagem da Folha da semana passada informa que o cunhado de Ivete Sangalo, que também é seu sócio, está sendo investigado pela Receita Federal. Luis Paulo de Souza Nunes controla as empresas Caco de Telha, que negocia os shows, e a Banda do Bem - Produções Artísticas Ltda.

Segundo o repórter Graciliano Rocha, o negócio é “suspeito de sonegação fiscal e de não pagar tributos trabalhistas aos músicos que se apresentam com a artista baiana. Alvo de investigação da Receita Federal desde fevereiro deste ano, a Banda do Bem apresenta em seu registro de sócios apenas um grupo de 13 músicos – todos tocam ou tocavam com Ivete. No registro da empresa, Nunes, que também é sócio da família Sangalo em três outras empresas, aparece como seu administrador”.

Processo fiscal e trabalhista

As investigações tiveram início a partir de um processo fiscal e trabalhista movido pelo músico Antônio da Silva, o Toinho Batera. “Ele cobra indenização de R$ 5 milhões e acusa Ivete de usar a Banda do Bem como ‘fachada’ para não pagar encargos trabalhistas dos músicos, que aparecem como sócios da organização”. Nunes, que é casado com Mônica, irmã da cantora, tem vários negócios com família Sangalo. Em setembro de 2006, ele passou a integrar o quadro societário da empresa Mago Comunicação, agência de publicidade que integra a holding de Ivete.

Um dos chefões desta empresa é o empresário Jesus Sangalo, um dos principais organizadores do movimento Cansei, que teria sido responsável por envolver a irmã naquela furada. De pedra, Ivete Sangalo agora virou vidraça. A sorte dela é que a TV Globo não dará qualquer destaque para o tema.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Na Inglaterra, a Folha estaria em apuros

Por Eduardo Guimarães, no Blog da Cidadania:

O brasileiro já se acostumou à cantilena de que qualquer questionamento aos métodos cada vez mais desesperados da mídia local em busca de audiência ou de influir no jogo do poder seria “tentativa de censura”. Em países “marxistas” como a Inglaterra, porém, liberdade de imprensa não se confunde com liberdade para delinqüir.

O Comitê de Cultura, Mídia e Esportes do Parlamento britânico “convidou” Rupert Murdoch, uma espécie de Roberto Marinho gringo, seu filho James Murdoch e a diretora do império de mídia deles, Rebekah Brooks, para darem explicações sobre grampos ilegais utilizados pelo tablóide “The News of the World” para obter informações.

Mas a “fúria censora” inglesa não pára por aí. Novos documentos e gravações apontam que os jornais “Sunday Times” e ”The Sun”, do mesmo Murdoch, teriam tido acesso a dados financeiros privados do ex-premiê Gordon Brown e ao histórico médico do seu filho.

Como a Grã Bretanha entende que não se pode confundir liberdade de imprensa com práticas criminosas, o governo, pressionado pela sociedade, passou a impor obstáculos a Rupert Murdoch para adquirir a plataforma televisiva “BSkyB”. Por conta disso, aliás, é provável que a operação nem saia.

Alguém imagina coisa similar acontecendo no Brasil?

Em sua edição de 25 abril de 2009, o jornal “Folha de S. Paulo” reconheceu que publicou em sua primeira página, sem checar a veracidade, uma reprodução de ficha policial da então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, que recebera por e-mail (!!) de um site de ultra-direita.

A reportagem que acompanhava a falsificação acusava Dilma de ter participado de complô para seqüestrar o ministro da ditadura militar Delfim Neto. A ficha continha informações forjadas. E, apesar dos laudos mostrando a falsidade do “documento”, alguns dias depois o jornal manteve a mentira dizendo que não poderia confirmá-la ou desmenti-la.

As razões da “Folha” eram óbvias. O Brasil estava às portas da campanha eleitoral que escolheria o sucessor – ou a sucessora – de Lula e o jornal, partidário da candidatura de José Serra, tratava de tentar destruir a imagem da principal adversária do tucano.

Se tivéssemos a sorte de viver em um país civilizado em que o conceito “liberdade de imprensa” não serve de desculpa para a prática de falcatruas “jornalísticas” desse porte, e que entende que denunciá-las e puni-las não é censura coisa nenhuma, hoje o filho do baba-ovo da ditadura Otavio Frias de Oliveira, estaria frito.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Mídia ataca e Dilma cresce

Por José Dirceu, em seu blog:

O apoio da população a presidenta Dilma Rousseff e a seu governo, e a credibilidade conferida a ela e à sua administração ampliam-se a cada pesquisa. Do último levantamento nacional, realizado pelo Datafolha, às pequisas recentes e regionais que se tornam públicas, a aceitação à presidenta e à sua gestão mantém-se em torno dos 50% ou melhora em várias delas.

Pesquisa publicada neste fim de semana (domingo), por exemplo, pela Tribuna do Norte, jornal de Natal (RN), indica que 61,4% dos natalenses aprovam a presidenta e seu governo, contra apenas 25,4% que os desaprovam.

O levantamento, feito pelo Instituto Certus para medir a avaliação dos moradores da capital potiguar nestes primeiros seis meses de governo Dilma, avaliou, também, as administrações da governadora do Rio Grande do Norte, Rosalba Ciarlini (DEM), e da prefeita de Natal, Micarla de Souza (PV).

Mídia, a verdadeira oposição

Única governadora eleita pelo DEM a se manter no partido (o outro, governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo, migrou para o PSD do prefeito paulistano Gilberto Kassab), Rosalba tem 25,4% de aprovação dos natalenses, contra 55,6% de desaprovação. Já a prefeita Micarla tem sua administração desaprovada por 88,6% da população contra só 7.8% que a aprovam.

Levantamentos como estes, sejam nacionais, sejam regionais, mostram, de novo, a inutilidade dos ataques da mídia ao governo Dilma em todas frentes e temas. A verdadeira oposição, a mídia, repito, de novo, tirou as máscaras da conciliação com a presidenta, ao que tudo indica desesperançada, já que a chefe do governo nem rompeu com o antecessor, o ex-presidente Lula, nem abandonou o modelo econômico como queriam nossos donos do 4º poder.

Um 4º poder, repita-se, hoje ameaçado aqui e no mundo pelas redes sociais, pela blogosfera independente e pela emergência entre as classes populares e dos pobres, de um sentimento e uma consciência nacionais quanto aos seus direitos universais, numa demonstração do quanto elas valorizam a democaracia, a liberdade e a justiça social, no nosso caso representadas pelo governo Dilma Rousseff.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

A crise européia e a agonia neoliberal

Por Saul Leblon, no sítio Carta Maior:

A longa agonia do arcabouço ideológico neoliberal registrou mais um espasmo pedagógico.

Na terça-feira (5) governantes e autoridades financeiras da União Européia rangeram e rugiram diante da decisão da agencia de risco Moody's, que reduziu a classificação dos títulos da dívida portuguesa para a categoria ‘junk’ (lixo).

Lisboa acaba de obter um socorro de 78 bilhões de euros, em três anos, em troca de um pacote de ajuste que o próprio primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, direitista assumido, admite ser um gigantesco contrato de recessão com o futuro. A exemplo do que faz a Grécia, a auto-imolação lusa inclui demissões, cortes de gastos em áreas essenciais, aumento de impostos e privatização, inclusive da tevê pública portuguesa.

Inútil. O veredito da Moody’s baseia-se na constatação de que o sacrifício não será suficiente porque não é viável.

A sentença coloca sob suspeição e risco todo o esforço na mesma direção implementado pela troika -Banco Central Europeu, Comissão Europeia e o FMI - para evitar o desmonte financeiro da UE, trincado verticalmente pelo pré-calote da Grécia, a quebra da Islândia, o descrédito crescente na solvência das dívidas soberanas da Espanha, Itália, Bélgica etc.

As interações estruturais nessa engrenagem avariada não tardaram a dar razão ao pânico desencadeado pelo rebaixamento da dívida portuguesa.

Vinte e quatro horas após o disparo da Moody’s, ações dos bancos espanhóis, que detém mais de 50% da dívida externa portuguesa, desabaram.

O efeito contágio atingiu também a dívida soberana da Espanha obrigando Madri a elevar os juros pagos aos seus credores ao nível mais alto dos últimos três meses e jurar de pés juntos: ‘Nãos somos Portugal; não somos a Grécia.

O rastilho derrubou as bolsas de Milão, Frankfurt, Paris, Londres, Atenas e Dublin na quarta-feira, deixando claro o abraço de afogados que tais ‘imprevistos’ desencadeiam. E continuarão a desencadear.

Mas o episódio português ilustra, sobretudo, os paradoxos típicos dos crepúsculos históricos. À falta de novos protagonistas - e de novos projetos -, criaturas e criadores do capítulo agonizante se desentendem nos seus próprios termos.

É assim que se deve interpretar a reação contrariada da dama de ferro prussiana, a chanceler alemã Ângela Merkel, diante da decisão da Moody’s.

“É importante que a troika não permita que lhe retirem a capacidade de avaliação”, disse Merkel referindo-se à estratégia definida pelo Banco Central Europeu, pela Comissão Europeia e pelo FMI para os resgates de países em dificuldades financeiras, casos da Grécia e de Portugal.

O que Ângela Merkel está exigindo, no fundo, é que os entes sagrados do neoliberalismo devolvam aos Estados – portanto à soberania da política - o poder de comandar o destino da sociedade e da economia.

Bem mais enfático – a refletir a sua extração à esquerda da chanceler - o diretor da Agência das Nações Unidas para o Comércio Mundial e o Desenvolvimento (UNCTAD), Heiner Flassbeck, ex-secretário de Estado das Finanças alemão, disparou: “As agências de rating deviam limitar-se a avaliar empresas, não deveriam avaliar Estados”. Thomas Straubhaar, presidente do Instituto de Economia Mundial, de Hamburgo, foi lapidar: “A política foi monopolizada nas mãos de um punhado de institutos de avaliação”.

Nada como uma crise após a outra para iluminar as distorções da história.

No auge da glória neoliberal, nos anos 80/90 e até meados de 2000, as agencias de risco figuravam como uma espécie de mensageiro divino.

Investidas de poderes para emitir julgamentos sumários quanto a salvação ou o sacrifício das criaturas históricas, determinavam a sorte e os azares de bancos, empresas, governos e Nações. Direta ou indiretamente, todos eram instados a vergar suas vontades ao implacável torniquete indutor das avaliações de risco.

Uma espécie de ectoplasma da autorregulação num tempo em que tudo o que exalasse a soberania política ou planejamento público era picado e salgado na sarjeta do anacronismo obscurantista, as agências de risco reinavam incontestáveis nesse tempo.

Estavam acima da lei e da ordem; da urna e da Constituição. Acima da própria democracia.

Sobretudo a santíssima trindade representada pela Standard & Poor's, a Moody's e a Fitch – que determinavam, e ainda detém, 90% do poder de consagrar o que presta e o que não presta no universo da economia mundial— expressava o próprio espírito dos mercados, avessos a qualquer outro princípio ou ética que não a mobilidade irrestrita dos capitais.

Na mídia nativa, vanguardeira das boas causas do ramo, colunistas da gema ortodoxa vociferavam – ainda o fazem , com menor audiência, é certo - contra afrontas do governo Lula aos princípios desse poder ubíquo.

O argumento final irrespondível como irrespondíveis são as sentenças divinas, invariavelmente brandia a ameaça de uma punição no ‘rating’, a tábua sagrada de classificação do ‘risco–país’ das ditas agências.

Erigiu-se assim um círculo de ferro formado pela supremacia dos mercados financeiros desregulados, as agencias de risco e os centuriões vigilantes da mídia, associados à malta de consultores genuflexos.

Uma espécie de poder mundial opaco, mas contundente, vigiava e punia. À semelhança do panóptico de Foulcaut cuidava de assegurar que instituições, governos, empresas, mas também partidos —inclusive os de esquerda— se auto-vigiassem renunciando às transgressões ao credo neoliberal, um processo ao mesmo tempo repressivo e auto-adestrável.

Uma instituição de cooperação internacional, ou um banco privado, ou ainda um fundo de investimento, jamais poderiam – e ainda não podem - investir num país ou num projeto público ou privado que não tivesse o ‘OK’ das agências de risco. Era o vigia oculto do panóptico a condicionar projetos e agendas desde o seu nascimento. Nenhuma surpresa assim que o debate estratégico e mesmo certos vocábulos – ‘projeto de desenvolvimento’, ‘socialismo’, ‘soberania’, estatização’ e, claro, ‘comunismo’ - tenham sido extirpados da vida política nesse período. Menos surpresa ainda que um vazio intelectual vertiginoso tenha se instaurado na vida interna dos partidos, inclusive do PT brasileiro ao longo desse ciclo e de maneira progressiva até cristalizar o silêncio atual.

O interdito desse poder supracional tinha força suficiente para humilhar presidentes eleitos, obrigando-os a picar e engolir programas de governo sancionados nas urnas, caso afrontassem dogmas sagrados dos mercados.

Essa capa de inviolabilidade sagrada começou a esgarçar-se antes da crise mundial.

Em dezembro de 2001, por exemplo, a Enron, a sétima maior empresa dos EUA, gigante do setor de energia fortemente beneficiada pela desregulação nessa área, ruiu escandalosamente. A soterrá-la, uma montanha de práticas fraudulentas, avaliações falsas de ativos, transações simuladas entre diretores e investidores e milhões de dólares embolsados por uma verdadeira gangue de experts do jogo financeiro leve, livre e solto.

Nenhuma agencia de risco advertiu nem antecipou aos investidores incautos que havia uma mazorca em curso dentro de uma das maiores empresas de energia do mundo.

Auditores ‘independentes’,como a Arthur Andersen, haviam aprovado as contas da Enron pouco antes do rombo de US$ 13 bilhões derrubar as bolsas em todo o planeta.

Assim, de tropeço em tropeço, omissão e omissão, a santíssima trindade das agencias veria sua aura perder brilho crescente até se tornar um buraco negro no auge da crise mundial, em 2007/2008/2009.

Quando o banco Lehamann Brothers quebrou em setembro de 2008, dando a largada para a maior crise do capitalismo desde 1929, seus papéis desfrutavam de avaliação AAA pelas criteriosas agencias de risco.

Um mês depois do Lehamann Brothers quebraria a Islândia.

Até quase a véspera do naufrágio, a mesma Moody’s que agora esfaqueia a direita portuguesa pelas costas – ou lhe desfecha ‘um murro no estômago’, no dizer do desabrido primeiro-ministro conservador, Pedro Passos Coelho - emprestava às finanças islandesas o carimbo de um triplo A: segurança, rentabilidade e solidez.

Na farra das subprimes nos EUA, papéis de créditos podres fatiados e ‘inseridos’ em pacotes de investimento tóxicos tiveram igualmente um lubrificante eficaz na chancela das agencias de risco, para escorregarem goela abaixo de fundos espertos e investidores crédulos mundo afora.

O resultado desse intercurso é conhecido, embora ainda inconcluso.

A colisão que se assiste agora entre agencias e a ortodoxia da troika do euro configura os esgares de uma época que teima em não terminar. Seu crepúsculo não será revertido com remendos para salvaguardar povos e nações dos riscos embutidos na ação das agencias de risco.

Num ato falho, como vimos acima, a chanceler alemã Ângela Merkel, cobrou que os entes criados pelos livres mercados não usurpem a prerrogativa da troika de ditar os rumos da sociedade.

Devolver à política a soberania das decisões sobre a liberdade humana e o destino do desenvolvimento, porém, não é algo que se possa fazer de forma compartimentada e estanque.

O que a chanceler não parece entender, porque não pode ou não quer, é que a mesma prerrogativa vale para a sociedade grega, por exemplo, 75% dela contrária ao esmagamento ortodoxo que a troika afrontada agora pela Moody’s quer impor ao país, com o apoio de uma Parlamento-zumbi, a contrapelo da praça Sintagma. É ali, a exemplo de outras praças e ruas do mundo, que a multidão revitaliza o único poder capaz de se opor à ditadura dos mercado, das agencias e do dinheiro: a democracia participativa.

A internet e a rebelião dos homens

Por Mauro Santayana, em seu blog:

Imagine o leitor que em fevereiro de 1848 já houvesse a rede mundial de computadores. Vamos supor que, em lugar de imprimir os primeiros e poucos exemplares do Manifesto Comunista, Marx e Engels tivessem usado a internet, de forma a que todos os trabalhadores europeus e norte-americanos pudessem ler o texto. Qual teria sido o desenvolvimento do processo? Como sabemos, o ano de 1848 foi de rebeliões operárias na Europa, reprimidas com toda a violência.

O capitalismo selvagem de então, um dos filhos bastardos da Revolução Francesa, sentiu-se animado pela derrota dos trabalhadores. Na França a burguesia tomou conta do poder e, derrotada a monarquia, assumiu-o sem disfarces e sem intermediários, em um período que os historiadores denominam de “A República dos homens de negócios”. Os trabalhadores e intelectuais tentaram, mais tarde, em 1871, logo depois de a França ser derrotada pelos alemães, criar um governo autônomo e igualitário em Paris. Com a ajuda dos invasores, o Exército de Thiers executou 20.000 parisienses nas ruas.

As manifestações populares dos países árabes, que os governos e a imprensa dos Estados Unidos e da Europa saudaram como o fim dos tiranos e o início da democratização do mundo islâmico, entram em nova etapa, ao atingir os países ricos. Os analistas apressados são conduzidos a rever suas conclusões. O mal-estar que levou os povos às ruas não se limita ao norte da África: é fenômeno mundial.

Uma das contradições do capitalismo, principalmente nessa nova etapa, a do imperialismo desembuçado, no qual os governos nacionais não passam de meros servidores dos donos do dinheiro, é a de sua incapacidade em estabelecer limites. Hoje, nos Estados Unidos – que foram, em um tempo, o espaço para a realização de milhões de pessoas mediante o trabalho – a diferença entre os ricos e os pobres é maior do que durante toda a sua História, incluído o tempo da escravidão. Um por cento da população norte-americana detém 40% de toda a riqueza nacional. A mesma situação se repete em quase todos os paises nórdicos.

Quando redigíamos este texto, milhares de pessoas se encontravam acampadas no centro de Madri, em continuidade ao movimento Democracia Real, Já, que se iniciou em 15 de maio, com protestos em todas as grandes cidades espanholas. A Espanha hoje está dominada pelos grandes banqueiros e companhias multinacionais, que não só exploram o trabalho nacional, como vivem de explorar os paises latino-americanos. Bancos como o Santander – cujos resultados mais expressivos ele os obtém no Brasil – dividem com os dois partidos que se revezam no poder (os socialistas e os conservadores) o resultado do assalto à economia do país. É contra esse sistema odioso que os espanhóis foram às ruas, e nas ruas continuam.

Não são apenas os jovens desempregados que se indignam. São principalmente as mulheres e homens maduros, os que estimulam o movimento. Eles sentem que seus filhos e netos estarão condenados a um futuro a cada dia mais tenebroso e mais violento, se os cidadãos não reagirem imediatamente. Os espanhóis estão promovendo a articulação internacional de movimentos semelhantes, que ocorrem em outros países, como a Islândia, a França, a Inglaterra e mesmo os Estados Unidos. Se o sistema financeiro se articulou, com o Consenso de Washington e os encontros periódicos entre os homens mais ricos do planeta, a fim de dominar e explorar globalmente os povos, é preciso que os cidadãos do mundo inteiro reajam.

Marx queria a união de todos os proletários do mundo. O movimento de hoje é mais amplo e seu lema poderia ser: Seres humanos do mundo inteiro, uni-vos.

Rafinha Bastos é alvo do Ministério Público

Por Altamiro Borges, em seu blog

Numa decisão que irritará os donos da mídia, que se consideram acima das leis e do Estado de Direito, o Ministério Público de São Paulo pediu hoje (7) a abertura de inquérito policial contra o humorista Rafinha Bastos, do programa "CQC" da TV Bandeirantes, para apurar suas recentes declarações machistas sobre o estupro, que caracterizariam incitação e apologia ao crime.

As declarações foram feitas em seu show de comédia stand-up e foram reproduzidas na revista "Rolling Stone". O "humorista" afirmou na ocasião que toda mulher que reclama que foi estuprada é feia, e que o homem que cometeu o ato merecia um abraço, e não cadeia.

"O estupro é um crime"

O pedido de abertura do inquérito foi feito pela promotora de Justiça Valéria Diez Scarance Fernandes, coordenadora do Núcleo de Combate à Violência Doméstica e Familiar. No ofício, ela argumenta que Rafinha Bastos compara o estupro a "uma oportunidade" para determinadas mulheres e o estuprador a um benfeitor, digno de "um abraço". "O estupro é um crime. O estuprador é um criminoso que deve ser punido e não publicamente incentivado", conclui Valéria Fernandes.

A ação é resultado de representação feita à Promotoria pela coordenadora do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher, da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Thais Helena Costa Nader. Quando da "piadinha" de péssimo gosto, o Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo, órgão composto por representantes da sociedade e do poder público, divulgou dura nota de repúdio:

Reflexo da pressão popular

"A liberdade de expressão, direito previsto constitucionalmente, encontra limite quando em choque com outro direito, que é o da dignidade da pessoa humana, que está acima de qualquer outro", diz a nota. O conselho viu na piada de Bastos conteúdo machista e preconceituoso, "encorajando homens, bem como fazendo parecer que o crime de estupro, hediondo por sua natureza, não seja punível".

O "humorista" também foi alvo de várias manifestações de protesto. Em São Paulo, as participantes da Marcha das Vadias realizaram um ato de repúdio em frente ao Comedians, o clube de comédia de Rafinha Bastos. No Rio, ele também foi vaiado por suas declarações machistas. Agora, com a decisão do MP paulista, o "humorista" terá que prestar esclarecimentos. A coisa esquentou!

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Professora Amanda Gurgel se recusa a receber prêmio de empresários em SP

Redação Carta Capital

A professora Amanda Gurgel, que ficou conhecida após fazer um discurso na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte a respeito da situação da educação no Estado – que resultou num vídeo acessado por mais de um milhão de internautas no YouTube – recusou, no sábado 2, receber um prêmio oferecido em sua homenagem pela associação Pensamento Nacional de Bases Empresariais.

Veja o vídeo neste link https://www.youtube.com/watch?v=aC3u_hxa4JQ&feature=player_embedded

A organização havia dedicado a ela o prêmio 2011 na categoria “educador de valor”. Em sua justificativa, a professora destacou que, “embora exista desde 1994, esta é a primeira vez que esse prêmio é destinado a uma professora”.

“Esse mesmo prêmio foi antes de mim destinado à Fundação Bradesco, à Fundação Victor Civita (editora Abril), ao Canal Futura (mantido pela Rede Globo) e a empresários da educação. Em categorias diferentes também foram agraciadas com ele corporações como Banco Itaú, Embraer, Natura Cosméticos, McDonald’s, Brasil Telecon e Casas Bahia, bem como a políticos tradicionais como Fernando Henrique Cardoso, Pedro Simon, Gabriel Chalita e Marina Silva. A minha luta é muito diferente dessas instituições, empresas e personalidades”, justificou.

Amanda Gurgel, que em seu discurso na Assembleia se queixou do salário que recebe como professora e da situação do sistema de ensino no País, disse que seus projetos são “diametralmente diferentes daqueles que norteiam o PNBE”, grupo mantido por empresários paulistas e, segundo ela, comprometida apenas com “a economia de mercado”, “à mercantilização do ensino e ao modelo empreendedorista”.

Entre as reivindicações da professora, manifestadas em seu site pessoal, estão a valorização do trabalho docente e a elevação para 10% da destinação do Produto Interno Bruto para a educação.

“Não quero que nenhum centavo seja dirigido para organizações que se autodenominam amigas ou parceiras da escola, mas que encaram estas apenas como uma oportunidade de marketing ou, simplesmente, de negócios e desoneração fiscal”, escreveu ela, antes de dizer que não poderia aceitar o prêmio.

Serra à beira de um ataque de nervos

Por Ilimar Franco, O Globo

A cena aconteceu no gabinete do líder do PSDB no Senado, Álvaro Dias (PR). José Serra entra na sala e aborda o presidente mineiro dos tucanos, deputado Marcus Pestana.

Serra atacou: "Nós somos amigos! Você fica falando mal de mim! Você vai sossegar agora."

Pestana reagiu: "Você tá doido!"

O bate-boca não parou aí. Foi preciso que a turma do deixa-disso entrasse em campo para abafar o acalorado embate. Na plateia, uns 20 parlamentares tucanos.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Jair Bolsonaro: "Sou preconceituoso, com muito orgulho"

Para quem quer conhecer melhor o fascista do Bolsonaro.

Redação Época

ENTREVISTA - JAIR BOLSONARO

QUEM É
Paulista, militar da reserva, 56 anos, casado, pai de cinco filhos

O QUE FAZ
Cumpre o sexto mandato de deputado federal

O QUE FEZ
Ex-capitão do Exército, foi professor de educação física e vereador do Rio de Janeiro. Antes de se filiar ao PP, foi do PDC, PPR, PPB, PTB e PFL

A maioria dos parlamentares foge de discussões sobre temas polêmicos. O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) faz questão de correr ao encontro de alguns deles. Ex-capitão do Exército, Bolsonaro sustenta posturas radicais, como a defesa do período da ditadura militar (1964-85). Em defesa de suas opiniões, Bolsonaro comete erros históricos, por exemplo, ao dizer que durante os vinte anos do governo militar havia liberdade e pleno emprego no Brasil. Recentemente, Bolsonaro assumiu o protagonismo na oposição ao projeto que torna crime ataques a homossexuais e ajudou a derrubar a distribuição de kits contra homofobia nas escolas. Na semana passada, após ser absolvido em um processo disciplinar no Conselho de Ética, Bolsonaro respondeu às perguntas dos leitores de ÉPOCA.


Gostaria de saber qual seria a sua reação se alguém de sua família decidisse abertamente pela homossexualidade.
Pio Barbosa Neto, CE
Jair Bolsonaro - Seria problema dele. Se essa fosse sua opção para ser feliz não estaria (nem poderia) ser proibido por mim mas, certamente, não iria me convencer a frequentar minha casa.

Qual o limite entre a liberdade de expressão e a ofensa à dignidade daqueles que não se enquadram na sua concepção, como os homossexuais?
Alexsandre Victor Leite Peixoto, AL
Bolsonaro - Minha luta vitoriosa no Congresso foi contra a distribuição do kit gay nas escolas do 1º grau. Não podia me omitir diante do material que estimulava nossos meninos e meninas a ser homossexuais. E deviam se orgulhar dessa condição. No mais, tudo é demagogia, pois certamente não acredito que nenhum pai possa se orgulhar de ter um filho gay. Homossexualismo é comportamento.

Se você estivesse precisando de uma transfusão de sangue e o único sangue doado fosse de um homossexual, aceitaria a transfusão?
Matheus Nunes, RJ
Bolsonaro - O risco de ser contaminado com o sangue de homossexual é 17 vezes maior do que com o de heterossexual. Duvido que alguém aceite sangue doado por homossexual sabendo desse risco. Cuidar da minha saúde é diferente de ser preconceituoso.

O que o senhor acha sobre a possibilidade de adoção de crianças por pais homossexuais?
Daniel Tonatto, RS
Bolsonaro - Somos produtos do meio. Uma inocente criança adotada por pais (?) homossexuais certamente será influenciada e possivelmente seguirá o exemplo dos mesmos. Em vez de aceitar a mentira de que é melhor uma criança ser adotada por casal homossexual, prefiro uma séria política de paternidade responsável.

O senhor não acha que estão querendo acirrar ainda mais a homofobia, tratando os homossexuais com diferenciação?
Luiz Curvelo, RJ
Bolsonaro - O PLC 122 que está para ser votado no Senado visa, por exemplo, a condenar de 2 a 5 anos uma pessoa que se negue a vender sua bicicleta a um homossexual. Se aprovado, fará com que um homicida cumpra menos anos de prisão do que quem chame alguém de gay ou bicha.

Se o PL122/06 fosse aprovado, intimidaria os assassinos de homossexuais. Qual seria a ação que o Legislativo deveria tomar para garantir os direitos da população LGBT?
Camilo Oliveira, RJ
Bolsonaro - A maioria dos homossexuais é assassinada por seus respectivos cafetões, em áreas de prostituição e de consumo de drogas, inclusive em horários em que o cidadão de bem já está dormindo. O PLC 122, na prática, criará uma categoria de vítimas privilegiadas, ou seja, com proteção especial em virtude de sua opção sexual. Assassinar um heterossexual é menos grave que matar um homossexual. Hoje, por exemplo, mais de 10 esposas/companheiras são assassinadas por dia. O que intimidaria a prática de qualquer crime seria a certeza de punição rápida e justa, sendo a pena cumprida em sua totalidade sem qualquer regalia e com trabalhos, ainda que forçados, que pagassem o sustento do preso.

O senhor diz que bateria no seu filho, caso ele fosse efeminado. Frases desse tipo não são, na verdade, uma tentativa de aparecer na mídia e, assim, se eleger novamente?
Flávia de Oliveira, SP
Bolsonaro - Quando se perde o argumento me acusam de estar à procura de votos. Se posso mudar o comportamento de um filho agressivo ou desrespeitoso por que não poderia mudar o efeminado com a mesma atitude? Homossexualismo, como regra, é comportamento e não genética.

O senhor acha que um deputado federal precisa ser desprendido de preconceitos para avaliar com mais imparcialidade as leis?
Suzan Vitorino, PE
Bolsonaro - O Congresso é formado por pessoas de todas as vertentes da sociedade e cada parlamentar tem o dever de defender as ideias que o seu eleitorado lhe confia. Se lutar para impedir a distribuição do kit-gay nas escolas de ensino fundamental com a intenção de estimular o homossexualismo, em verdadeira afronta à família é ser preconceituoso, então sou preconceituoso, com muito orgulho.

O Estado por lei deve ser laico. Você não acha errado, como deputado, usar argumentos religiosos para reforçar sua crítica contra homossexuais?
Diego da Cunha, RJ
Bolsonaro - O Estado é laico, mas seu povo não. Somente católicos e evangélicos somam mais de 90% de brasileiros. A religião é fator de união dos povos e não pode ser desassociada da família, dos bons costumes e da moralidade.

Gostaria de saber se o deputado segue algum tipo de religião.
Suzana Marques, RJ
Bolsonaro - Acredito em Deus, essa é a minha religião. Sou um católico que, por 10 anos, frequentou a Igreja Batista.

Qual a sua opinião sobre a legalização da maconha?
Carlos Magno, RJ
Bolsonaro - Entendo que a “Marcha da Maconha” faz apologia ao consumo da maconha, porta de entrada para as drogas pesadas. Estudos sérios indicam que o uso da maconha causa grandes malefícios aos seus usuários, particularmente aos mais jovens e, por esse motivo, sou contra a legalização.

Qual a opinião do senhor sobre a democracia?
Paulo Azevedo, RJ
Bolsonaro - Vivemos um período de pleno emprego, segurança, liberdade e respeito entre 1964 e 1985. Se houver uma pesquisa entre pessoas com idade superior a 60 anos tenho certeza de que a quase totalidade concordará com essa afirmação. Hoje temos medo de ir à escola, pois corremos o risco de sermos assaltados ou assassinados, mesmo durante o dia. Nossa “democracia” é governada por “líderes” que idolatram “democratas” como Fidel Castro, Hugo Chávez, Ahmadinejad e Khadafi.

“A maioria dos homossexuais é assassinada por seus respectivos cafetões, em horários em que o cidadão de bem já está dormindo”
Várias vezes o senhor comentou em entrevistas que era a favor de uma possível volta do governo ditatorial no Brasil. Por quê?
Rafael Lima de Oliveira, CE
Bolsonaro - É mentira que o regime militar foi uma ditadura. Foi uma necessidade para aquele momento, e a adoção do regime foi motivada por anseios de todos os segmentos da sociedade, incluindo a mídia em geral e a igreja. Essa afirmativa pode ser comprovada com a leitura de jornais e revistas da época. Há 25 anos os militares são vilipendiados diuturnamente, inclusive acusados de torturadores, e as Forças Armadas permanecem como uma das instituições mais confiáveis do país, o que induz ao entendimento de que fizeram um bom governo.

Se o senhor se diz partidário da família, dos bons costumes e dos cristãos, por que ser defensor da ditadura?
Raquel Pereira de Medeiro, SP
Bolsonaro - É uma grande mentira atribuir o adjetivo de ditadura ao regime implantado no Brasil, no período de 1964 a 1985. Ditadura, à época, existia em Cuba e perdura até os dias atuais, onde os integrantes da cúpula do nosso governo vão passar férias e idolatram Fidel Castro. O que os militares fizeram naquele momento foi evitar a implantação da ditadura do proletariado que, certamente, estaria perdurando até os dias atuais, a exemplo de Cuba.

Em qual aspecto o senhor sente mais falta do regime militar?
Darlan Westphal Bittencourt da Cunha, SC
Bolsonaro - Do respeito às autoridades, aos professores, do pleno emprego, da segurança e da seriedade como se tratava a coisa pública. Não há notícia de um só oficial-general, coronel, capitão ou sargento que tenha enriquecido. Essa foi a principal causa do Brasil ter passado da 49ª para a 8ª economia mundial, os militares não eram corruptos.

A Comissão da Verdade seria revanchismo?
Jonhatan Amaral, CE
Bolsonaro - Partindo do princípio de que todos os integrantes serão indicados pela presidente da República, não se pode esperar imparcialidade do que for relatado. O que se pretende é elaborar relatórios mentirosos, endeusando os petistas e demais adeptos da esquerda e satanizando os militares para que conste em livros didáticos uma nova história escrita de forma unilateral e mentirosa. Assim, fica claro que é um ato revanchista.

O senhor por algum motivo tem medo da divulgação dos documentos da época da ditadura militar?
Claudecir Soares Barboza, PR
Bolsonaro - Quem tem que ter medo é o pessoal da esquerda, pois tais documentos podem comprovar os recursos vindos por intermédio de Cuba para financiar a luta armada no Brasil. Fidel Castro deveria ter uma estátua, do tamanho do Cristo Redentor, como símbolo da democracia petista. Ditadura vivemos, sim, hoje em dia, em que o governo impede a criação de qualquer CPI e fecha o Congresso com medidas provisórias.

Durante o regime militar foi introduzida a disciplina escolar "Moral e Cívica". O senhor acredita que ela deveria retornar ao currículo dos alunos da rede pública?
Lucas Felizardo, RS
Bolsonaro - Além da disciplina “Moral e Cívica”, cantava-se o Hino Nacional com a mão no peito e levantava-se na entrada e saída do professor da sala de aula. Sem disciplina e educação séria não existe futuro promissor. Hoje tirou-se a autoridade do professor na sala de aula, adotam-se livros que ensinam a falar e fazer contas de formas erradas e ainda querem introduzir material didático para estimular nossos filhos a ser homossexuais.

Gostaria de saber se seria possível um golpe militar nos dias atuais. E, como ex-militar, se isso viesse a ocorrer, quais seriam as melhorias imediatas?
Adriano Barbosa de Souza, MG
Bolsonaro - Os militares não dão golpe. As Forças Armadas são instituições permanentes e, tradicionalmente, sempre atenderam os anseios do povo, já que desde suas criações são formadas por integrantes de todos os segmentos sociais. Assim foi em 1964. O povo, sim, é que deveria dar um “golpe” nos maus políticos que iludem a boa fé dos eleitores. Alguém tem alguma dúvida que programas assistencialistas, como o Bolsa Família, que acostuma o homem à ociosidade, são um obstáculo para que se escolha um bom presidente? Já dizia o saudoso Luiz Gonzaga: “Mas doutô uma esmola a um homem qui é são ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão”.

O que o senhor acha que seria preciso para a direita conservadora voltar a ter voz na mídia nacional?
Gabriel da Costa Neto Nunes, DF
Bolsonaro - A mídia, atualmente, depende basicamente de recursos governamentais. Assim, por necessidade, discrimina e sataniza os políticos de direita, já que o governo é de esquerda.

O senhor tem alguma pretensão de criar um partido realmente de direita, já que o seu próprio PP faz parte da bancada governista de esquerda?
Robson Tavares de Abreu, RJ
Bolsonaro - É muito trabalhoso e caro criar um novo partido, já que ele nasce sem horário para a propaganda na TV e no rádio. O PP, embora apoie o governo, não patrulha seus deputados, que têm liberdade de expressar suas opiniões e votos, como é o meu caso.

Qual a sua opinião quanto à criação do Partido Militar Brasileiro?
Roberto Lanius, SC
Bolsonaro - Creio que os militares, por suas limitações econômicas e políticas, encontrarão muitas dificuldades para manter um partido com essa denominação, pois faltarão argumentos para angariar votos de civis. O PMB é um partido natimorto até porque seu presidente, um capitão da PM de São Paulo, declarou que repudia o que denominou “golpe de 1964”. Gostaria de lhe perguntar se endeusa os que mataram o jovem tenente Alberto Mendes Júnior, no Vale do Ribeira, e se sua preferência é pelos militares das Forças Armadas ou pelo bando de Carlos Lamarca.

O senhor fala que é livre para votar em matérias sem obrigação do partido. Por que votou na MP que pode esconder as falcatruas nas licitações para a Copa do Mundo e para as Olimpíadas?
Fernando Pedro da Silva, RJ
Bolsonaro - Foi um de meus raros votos com o partido. Só um idiota pode acreditar que qualquer obra possa ser realizada com gastos secretos. Pelo projeto, o TCU e o MP têm acesso a todas as fases da licitação. Após a concorrência, o governo abre o seu orçamento. Desde o fim do período militar, as falcatruas tornaram-se regra no Executivo.

Há reais intenções em desmilitarizar as polícias estaduais para caminhar em direção à unificação? O senhor é a favor do fim do alistamento obrigatório?
Wagner Pereira, SP
Bolsonaro - Na realidade há outras intenções por parte de quem defende essas ideias, tal como retirar o porte de arma de policiais e bombeiros militares fora do serviço. Há de se ressaltar que somente 5% dos alistados são aproveitados e a quase totalidade dos jovens que incorporam são voluntários. Os que serviram as Forças Armadas sempre lembram com muito orgulho seu passado de recruta.

“Fidel Castro deveria ter uma estátua, do tamanho do Cristo Redentor, como símbolo da democracia petista”
O senhor acha necessário que exista algum controle de imigrantes que venham trabalhar no Brasil? A direita europeia está certa em restringir a imigração?
Toni Ricardo Eugênio dos Santos, SP
Bolsonaro - Sim. E mais, o Brasil não pode continuar crescendo à taxa de 3 milhões de habitantes por ano. Sem uma política de planejamento familiar fica inviável combater a miséria, a fome e a violência. Por outro lado, estrangeiros vêm ao Brasil pela falta de mão de obra especializada em nosso meio.

É verdade que o senhor votou num projeto de lei para acabar com o 13º Salário, FGTS, Licença Gestante e outros direitos trabalhistas, conforme consta num e-mail que circula pela internet?
Gesiel Oliveira, PA
Bolsonaro - Essa foi uma das grandes mentiras do PT para conquistar maioria nas eleições de 2002. Na web, a campanha foi massiva contra os candidatos do PMDB, PFL, PTB e PP. Os candidatros do PT e PC do B foram os grandes beneficiados com essa campanha difamatória. Tais direitos estão incluídos no art. 7º da Constituição, considerados como “cláusula pétrea”. Portanto, não passível de supressão nem por proposta de emenda à Constituição, muito menos por projeto de lei como foi divulgado.

Os militares terão aumento neste ano?
Wilton José Soares de Medeiros, PB
Bolsonaro - A decisão de reajustar a remuneração dos militares é privativa da Presidente da República, Dilma Rousseff, que assumiu compromisso, por escrito, de manter a política salarial de seu antecessor, com recomposição anual. Entretanto, até o momento, se nega a discutir tal assunto.

Como motivar nossos militares se os salários nas Forças Armadas são baixos e outras carreiras de Estado têm salários melhores?
Paulo da Silva Gomes, RN
Bolsonaro - Por ano, mais de 500 oficiais e praças de carreira deixam as Forças Armadas, sendo a maioria por aprovação em concurso público. Não dá para ser patriota com uma família para sustentar e passando necessidade. O governo sempre se prevaleceu da disciplina para subjugar os militares. O revanchismo ainda fala alto no governo do PT.

A MP 2215/2000 está parada no Congresso Nacional há quase dez anos. O que ela representa para a família militar?
Claudio Oliveira, RJ
Bolsonaro - A Medida Provisória 2215-10, que trata da Lei de Remuneração dos Militares, é originariamente de dezembro de 2000. Seu relator, Romeu Tuma, faleceu sem poder colocá-la em votação. Essa MP provoca enorme desestímulo para a carreira. Infelizmente o Legislativo não tem independência para votá-la e o Executivo parece ter interesse na deterioração do material humano militar.

Gostaria de saber como anda o seu projeto em relação ao fim do exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Felipe Azevedo, RJ
Bolsonaro - O lobby da OAB no Congresso é muito forte. Tal exame rende, anualmente, milhões de reais aos cofres da entidade. No período militar não existia tal exame e os alunos eram melhores formados que nos dias atuais, e não eram extorquidos pela OAB.

Por que o senhor é contra o exame da OAB? O senhor não acha que acirrará ainda mais o mercado de trabalho dos advogados?
Murilo Silva Lacerda, MG
Bolsonaro - É um absurdo que depois de, no mínimo, 5 anos de estudos e aprovação em uma faculdade autorizada a funcionar e fiscalizada pelo governo, um bacharel fique impedido de exercer sua profissão por exigência de uma entidade que se diz democrática. Discordo de que a liberação dos formandos acirrará ainda mais o mercado de trabalhos dos advogados. Em todas as demais profissões existem bons e maus profissionais e sempre que ocorre excesso de profissionais a lei de mercado faz com os jovens busquem alternativas.

Caso fosse eleito Presidente da República, quais seriam suas 3 prioridades?
Rubem B. Weber, PA
Bolsonaro - Obrigado pela lembrança e, se fosse o caso, conduziria o país de forma semelhante ao período entre 1964 a 1985, quando o professor era valorizado, o policial sentia orgulho de sua profissão, o Congresso tinha moral e o Judiciário era respeitado.

Deputado, quando e por que o senhor foi demitido do serviço ativo do Exército Brasileiro?
Nelson dos Santos Carmona, BA
Bolsonaro - Não fui demitido, mas sim transferido para reserva remunerada, por força de imposição legal, ao ser diplomado vereador pelo Município do Rio de Janeiro, em 21 de dezembro de 1988.

O senhor não acha que, se explanasse suas ideias de forma mais branda e sem partir para o lado pessoal, teria uma maior aceitação do público em geral?
Amanda Ferreira, DF
Bolsonaro - Sem contundência ninguém é ouvido. Temos excelentes deputados que expressam suas ideias de forma polida e por isso não encontram eco na mídia.

Como o senhor avalia a abordagem da imprensa em geral com suas opiniões?
Allysson Almeida, RJ
Bolsonaro - Nunca me dão o benefício da dúvida. Para mim, tudo é fato consumado. Não posso ter opinião contrária, pois sou tachado de preconceituoso. Tenho paz na consciência e falo o que penso e tenho apoio de considerável parcela da sociedade.

O deputado avalia que suas declarações são divulgadas corretamente ou distorcidas?
Ednilson Souza, DF
Bolsonaro - Acontece de tudo. Minhas declarações vendem jornais e revistas e dão audiência no rádio e na TV. As distorções são apenas detalhes.

Bolsonaro ataca mais uma vez

Por Paulo Moreira Leite Geral, postado na revista Época

Confesso que fiquei chocado quando o cineasta Lars von Triers disse no Festival de Cannes que era capaz de “entender Hitler.” Embora tenha esclarecido que fazia apenas uma ironia, e tenha se desculpado logo em seguida, von Triers foi forçado a fazer as malas e deixar o evento antes do final.

Fiquei chocado porque considero von Triers um dos genios do cinema mundial. Seus filmes marcam nossa sensibilidade e representam um esforço honesto e raro de alcançar as tragédias e dores de nosso tempo. Sua obra não faz concessões a estética de Hollywood, ao poder do dinheiro e ao poder em geral. Faz justiça a palavra trangressão.

Gostaria muito que ele prosseguisse na construção de uma obra, riquíssima e de alto valor humanitário — apesar de sua declaração lamentável. Espero que se recupere.

Ao admitir uma empatia com Adolf Hitler, von Triers deixou em aberta a possibilidade de que pudesse comungar com idéias anti-semitas. É condenável.

Mas ele não pode ser acusado de manter um pensamento racista articulado e organizado, como acontece, por exemplo, com o estilista John Galeano, que já fez repetidos pronunciamentos preconceituosos contra judeus e de simpatia a Adolf Hitler.

Por que estou fazendo a comparação? Porque quero discutir outro preconceito – contra gays.

Considero que as declarações do capitão e deputado federal Jair Bolsonaro a ÉPOCA formam um conjunto escandaloso.

Bolsonaro admite, sim, que tem preconceito contra gays. Não é uma declaração solta, perdida. uma afirmação já repetida, articulada, no melhor estilo John Galeano. Em função de uma frase dita num ambiente fechado, que não pretendia que fosse divulgada, Galeano foi parar na polícia e está prestando contas à Justiça inglesa.

A declaração de Bolsonaro é pública. Nada lhe acontecerá porque se considera que, como parlamentar, não pode ser ameaçado em seu direito de emitir opiniões. Isso lhe dá o direito de fazer a propaganda de seu preconceito.

Foi por essa visão que dias atrás ele escapou de uma condenação quando o Congresso examinou uma declaração semelhante – a única dúvida, desta vez, é saber se ele fora racista, homofobico, ou os dois. Convencido que o prejuízo eleitoral de ser acusadado de racismo poderia ser imenso num país onde mais de 50% da população se declara negra, ele admite que tem preconceito “apenas” contra gays.

Sou inteiramente a favor da liberdade de expressão — e estranho que os parlamentares tenham uma garantia maior. Acho que todas as pessoas devem ter o direito de dizer o que sentem e pensam. A liberdade não pode ser um privilégio. Quero o mesmo direito de opinião para um deputado e para um cidadão comum. Estou errado? É razoável aceitar que um parlamentar tenha mais liberdade de opinião do que eu e você? Em nome de que?

Essa garantia suplementar talvez fizesse sentido nos tempos do regime militar, quando a população vivia sob censura e o parlamentar poderia perder o mandato em função de sua opinião. Bem ou mal, era uma forma de resistencia. E agora?

No caso específico de Bolsonaro, a ironia é mais gritante. Ao longo de sua carreira, e em suas atitudes cotidianas, ele demonstra um empenho regular e permanente de questionar a democratização do país e defender a ditadura militar. Você pode encontrar vários defeitos no Congresso brasileiro. Mas irá encontrar poucos políticos que demonstraram um empenho anti-democrático tão firme e descarado.

Um dos argumentos empregados na defesa de Bolsonaro é que não há lei específica contra a homofobia, o que tornaria razoável colocar em duvida a possibilidade de punição.

Concordo que uma legislação clara contra a homofobia pode ser útil, para reforçar garantias oferecidas pela democracia contra uma parcela da socieade que é alvo frequente de ataques e injurias. Mas vamos combinar que o Brasil não descobriu agora que todos são iguais perante a lei, e tem direito a proteção de sua dignidade. Isso está na Constituição, aprovada em 1988.

Toda pessoa que já ouviu um palavrão sabe quando se trata de um puro xingamento — e quando é um ataque, uma forma de atingir sua imagem e seus direitos.

Ao menos em teoria, não deveria ser preciso de leis específicas para condenar ataques a imigrantes nordestinos, a pessoas obesas ou mesmo com necessidades especiais.

Pergunto se a reação a Bolsonaro seria a mesma se, vem vez de gays, ele tivesse se referido a outros grupos sociais e comunidades específicas. Considerando o cotidiano de violencias que atingem os gays, seu acho esquisito que os juízes que proibiram as passeatas da maconha não tenham considerado que Bolsonaro faz apologia a um crime. O debate seria muito rico, vamos combinar.

Quem se recorda da mobilização produzida como resposta a um ataque racista do autodeclarado humorista Daniel Gentilli durante o debate sobre o metrô de Higienópolis — ele até correu o risco de perder um programa de entrevistas solo na TV – pode ter uma idéia clara do que estou dizendo. Corretamente, a frase de Gentilli, distribuída pelo twitter, mereceu um repúdio amplo e universal.

A reação diferenciada é um reflexo de uma visão diferenciada dessa questão. A crueldade de Bolsonaro contra os gays é exibida impunimente, à vista de todos. É um erro.

O preconceito não é mais ou menos grave pelo caráter de uma vítima em particular mas pelo prejuizo que produz em toda a socieade. Cada ser humano fica diminuido em sua dignidade quando outro ser humano é rebaixado por um tratamento indecente. A incompreensão dessa realidade produz omissões e até gestos de pura covardia.

Com frequencia, os preconceitos se misturam, se somam e se alimentam mutuamente. Isso porque eles se baseiam numa idéia única de hierarquia social, de superioridade natural de determinadas pessoas sobre outras. A sobrevivencia dos preconceitos exige que essa desigualdade seja reafirmada cotidianamente.

O preconceito é uma espécie de vigilia contra a igualdade, contra o direito à diferença, à individualidade. Sua origem é nebulosa, pois envolve palavras ouvidas na infancia, obras de autores de outras épocas e outros elementos. Sua finalidade política é a afirmar a superioridade — seja de um país sobre outro, uma cultura sobre outra, de uma classe social sobre outra.

Se você reparar, a maioria das pessoas que condenam homossexuais também deixam escapar ataques contra negros, contra judeus e até contra mulheres, ou, como hoje é frequente, contra as “loiras,” que é uma forma enrustida de ataque ao universo feminino. O fundo desse movimento é autoritário, violento e, como demonstra o depoimento de Bolsonaro, envolve uma visão de mundo e seu ideal de vida predileto é uma ditadura. Na entrevista a ÉPOCA, o capitão-deputado diz que “é uma mentira que o regime militar foi uma ditadura.”

No apogeu da colonização da África, o Rei Leopoldo, da Bélgica, que considerava-se um dos defensores da civilização ocidental, achava-se no direito de cortar mãos, braços e executar negros do Congo que não lhe entregavam carregamentos prometidos de diamante.

Hitler perseguia judeus — e também homossexuais, ciganos e militantes comunistas que, muitas vezes, designava como “bolcheviques judeus.”