Por Eduardo Magalhães, no Blog da Cidadania
Se você anda espalhando por aí que acredita nessa denúncia
de Gilmar Mendes contra Lula que a revista Veja publicou, ou é estúpido ou não
tem um pingo de caráter. É possível a qualquer pessoa, mesmo não sendo muito
inteligente, concluir, sem a menor sombra de dúvida, que tal denúncia não faz o
menor sentido.
Lula foi acusado de tentar interferir no andamento do
inquérito do mensalão propondo um escambo ao magistrado: ele postergaria o
julgamento até depois das eleições em troca de indulgência da CPI do Cachoeira
em relação a supostas evidências de seu envolvimento com Demóstenes Torres e
Carlos Cachoeira.
Gilmar foi Advogado-Geral da União do Governo Fernando
Henrique Cardoso. No último ano de seu mandato, FHC o indicou para ministro do
Supremo Tribunal Federal. Naquele momento, o professor da Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo Dalmo de Abreu Dallari teve um artigo publicado na
Folha de São Paulo em que declarou o seguinte sobre tal indicação:
Se essa indicação (de Gilmar Mendes) vier a ser
aprovada pelo Senado, não há exagero em afirmar que estarão correndo sério
risco a proteção dos direitos no Brasil, o combate à corrupção e a própria
normalidade constitucional. (…) o nome indicado está longe de preencher os
requisitos necessários para que alguém seja membro da mais alta corte do país.
Gilmar tentou processar criminalmente o jurista Dallari por
esse artigo, mas a Justiça recusou a instauração da ação penal que o agora
ministro do STF pretendia mover. Dizia a sentença: “A crítica, como
expressão de opinião, é a servidão que há de suportar (…) quem se encontrar
catalogado no rol das figuras importantes”
A previsão de Dallari se faria sentir cerca de seis anos
após a nomeação de Gilmar. Em 2008, o magistrado concedeu habeas-corpus ao
banqueiro Daniel Dantas. No mesmo dia, 42 procuradores da República, 134 juízes
federais e a Associação de Delegados da Polícia Federal (ADPF) divulgaram
documentos manifestando indignação com a soltura do banqueiro.
Alguns Procuradores Regionais da República estudaram até
fazer um abaixo-assinado solicitando o impeachment de Gilmar. O senador
Demóstenes Torres, então, já exibia suas relações com ele: classificou esse
movimento dos Procuradores Regionais da República como “ridículo”.
Esses são apenas alguns fatos que deveriam ser considerados
antes de pessoas subdotadas intelectualmente ou moralmente comprarem a acusação
de Gilmar a Lula sem o menor questionamento, mas não são o cerne da questão.
Servem apenas para lembrar quem é o sujeito que acusa o presidente mais querido
da história do Brasil.
O cerne da questão é que os oito anos de mandato de Lula
provam que ele jamais interferiu na Justiça com nenhum fim, muito menos para
impedir o progresso do inquérito do mensalão. Venho dizendo isso desde 2010,
quando publiquei um post contendo
informação que desmonta completamente a tese de Gilmar sobre o ex-presidente.
Lula nomeou três procuradores-gerais da República enquanto
que FHC manteve o mesmo, Geraldo Brindeiro, de 1995 a 2002, contrariando o
Ministério Público Federal por oito anos seguidos.
Claudio Fonteles, que hoje integra a Comissão da Verdade,
foi indicado por Lula em 2003 e ficou no cargo até 2005, quando o nome indicado
pelo MP foi acatado por Lula novamente. Antonio Fernando de Souza denunciou o
mensalão e foi reconduzido por Lula ao cargo. Ficou até 2009, quando Roberto
Gurgel, o novo escolhido pelo MP, foi nomeado. O mesmo Gurgel que recentemente
difamou o partido do ex-presidente na tevê.
Lula tinha o poder. Se não interferiu nem no Judiciário nem
no Ministério Público naquela época, se não há uma só denúncia de outro
ministro do STF de que tenha sofrido qualquer pressão do ex-presidente, por que
ele escolheria começar a fazê-lo justo com Gilmar Mendes, que tantas vezes se
mostrou um adversário político?
A história não se sustentaria só por isso, mas há mais.
Nelson Jobim, ex-ministro do Supremo e ministro da Defesa de Lula e Dilma, saiu
do governo dela descontente porque foi demitido por declarar publicamente que
votou em seu adversário José Serra em 2010. Esse mesmo Jobim desmentiu a
acusação de Gilmar a Lula.
É desolador o volume de desonestidade ou burrice que vêm
sendo espargidas com ímpeto tão infatigável. Tudo isso produz uma reflexão:
será possível que tanta canalhice venha a vingar? Até quando o Brasil será
esbofeteado dessa forma? Em que tipo de país mentiras tão grosseiras ganham tal
dimensão?
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